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Gilmar: o combate ao crime deve punir sim, mas respeitar dignidade da pessoa humana.

 

Gilmar: o combate ao crime deve punir sim, mas respeitar dignidade da pessoa humana.

O ministro reclamou de “comportamento animalesco e típico de perversão diante desse cenário de punitivismo.”

 

 

 

  • Márcio Falcão
  • Matheus Teixeira
  • Luiz Orlando Carneiro

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Na análise de dois habeas corpus contra transferência de presídio do ex-governador Sérgio Cabral, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, subiu o tom contra o juiz Marcelo Bretas, responsável pela Operação Lava Jato no Rio de Janeiro, por ter recebido auxílio-moradia, atacou indiretamente colegas (Edson Fachin e Roberto Barroso) que mandaram prender pessoas de 70 anos e 80 anos por falta de sensibilidade e ainda defendeu instalações adequadas para a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Gilmar também reclamou de comportamento animalesco e típico de perversão diante desse cenário de punitivismo.  Segundo o ministro, o combate ao crime deve punir sim, mas respeitar dignidade da pessoa humana. O discurso foi reforçado por Dias Toffoli e por Ricardo Lewandowski. 

As críticas de Gilmar foram dirigidas primeiramente ao juiz Marcelo Bretas, responsável pelo caso de Cabral. O magistrado fluminense contrariando resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que proíbe a remuneração a casais que morem sob o mesmo teto, buscou na Justiça receber o benefício de R$ 4,3 mil mensal.

Gilmar atacou o falso moralismo e citou que o processo sobre auxílio de Bretas correu em segredo. “Gente que a toda hora está dando lição de moral por aí… Esse processo foi estelionato pela via judicial”, disparou. “O processo está escondido nessa vara, espero que não com ajuda do juiz parte. Fato grave de quem preconiza tanta correção. Que está tão preocupado com exposição da sua casa. Ele que é feliz proprietário de imóvel, talvez dos mais ricos do Rio.”

O ministro disse que “nós somos mais recatados e o juízes são muito mais abertos em permitir que fotografem as nossas”.

Sem citar nomes, Gilmar rechaçou prisão de pessoas idosas, dizendo que “apurar crime sim, humilhar criminoso, não”. Recentemente, os ministros Edson Fachin e Roberto Barroso autorizaram as prisões do deputado afastado Paulo Maluf (PP-SP) e dos amigos do presidente Michel Temer na Operação Skala José Yunes e Coronel João Batista Lima Filho, que são idosos. “Quem fala em direitos humanos e decreta prisão de quem tem 80 e 90 anos, se existe céu e existe Deus, vai ter que ajustar as contas.”

O ministro colocou que “há uma mídia assaz opressiva nessa temática”, ao falar sobre comentários de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso em Curitiba,  vai ter suíte com banheiro. “O ex-presidente Lula vai ter uma suíte, um banheiro… Gente, onde que nós estamos com a cabeça? Aonde foi a nossa sensibilidade? Ter uma privada… onde que estamos com a cabeça? Tem um lado animalesco que está se manifestando em cada um de nós, é um tipo de perversão. Eu tenho vergonha que pessoas alfabetizadas, que tiveram sempre três ou quatro alimentações durante a vida, se comportem dessa maneira. São pervertidos. Isso não é correto. É preciso denunciar, combater o crime, sim, punir, sim, mas em respeito à dignidade da pessoa humana. Não pode ocorrer com policial, muito menos com juiz, é preciso que nós repudiemos as matérias que enchem os jornais, inclusive os televisivos, que contam historietas que, se forem verdadeiras, são absolutamente irrelevantes. Passei por vários casos e sempre na linha de fazer as coisas corretas. Se eu tivesse vulnerabilidade, já teria sido atingido.”

Toffoli foi quem mais reforçou os ataques de Mendes. “Esse que pousou com metralhadora ? É juiz ou justiceiro?”.  O ministro ainda contou que sua falecida mãe costumava dizer que ia a missa e que tinha padre que falava mal do tamanho da saias das moças novas. “Minha mãe dizia: esse deve ser o mais tarado. Quando falava de criança, dizia que esse deve ser pedófilo. O moralismo esconde coisas cruéis”.

Transferências 

Ao fim do julgamento, por 3 a 1, o colegiado concedeu habeas corpus a Cabral para permitir seu retorno ao presídio do Rio de Janeiro. Os ministros entenderam que é uma garantia do réu ficar próximo da família e dos advogados e que não havia elementos suficientes que embasassem a transferência para o presídio em Curitiba; apenas Fachin ficou vencido.

A 2ª Turma também manteve decisão do ministro que negou transferência de Cabral para presídio federal. No HC 149.734, que deu entrada em outubro do ano passado, Gilmar deu liminar e suspendeu a transferência do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral para presídio Federal em Mato Grosso do Sul, que havia sido determinada pelo Juízo da 7ª Vara Federal Criminal do Rio.

Ao conceder a liminar no HC, Gilmar Mendes disse que a inclusão em estabelecimento penal federal de segurança máxima é medida excepcional, conforme previsto no artigo 10 da Lei 11.671/2008, por impor ao preso um regime prisional mais gravoso, com maior restrição à liberdade. Salientou que as hipóteses de inclusão e transferência de alguém ao sistema federal devem ser rigorosamente observadas e podem ser combatidas pela defesa.

A defesa do ex-governador questionou a decisão que determinou sua transferência para estabelecimento de segurança máxima por meio de habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2). Lá o relator indeferiu a liminar. Em seguida, a defesa impetrou HC no Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde a relatora julgou inviável a impetração. Ao analisar o pedido de habeas corpus no STF, o ministro Gilmar Mendes disse verificar “manifesto constrangimento ilegal ao direito do paciente”.

 

Márcio Falcão – Brasília
Matheus Teixeira – Brasília
Luiz Orlando Carneiro – Brasília

Publicado orginalmente no site JOTA no dia 10.4.2017