A lei brasileira dispondo sobre eleições preceitua: só existem candidatos a cargos públicos eletivos depois da escolha pelas convenções partidárias e após o devido registro na Justiça Eleitoral. Mas desde o ano passado sabe-se quem são os candidatos a Presidência da República e aos governos estaduais. Em torno deles celebram-se as alianças regionais, combina-se o troca-troca dos partidos, com vistas à obtenção do maior tempo de propaganda no rádio e na televisão, os comícios políticos dos nossos dias. Os concorrentes antecipam-se sob os olhos do Ministério Público e do Judiciário Eleitoral. Quais as explicações para as campanhas antecipadas?
Os candidatos a candidato são sabedores: a legislação não acompanha a realidade dos fatos, e prosseguem nas articulações, nos acordos e declarações veiculadas diariamente pelos instrumentos da mídia. O descompasso não ocorre apenas na seara das normas eleitorais, estende-se a todo o ordenamento jurídico, contribuindo para a sua ineficácia.
Jean Cruet, no clássico “A vida do Direito e a inutilidade das Leis”, alerta para a realidade de que todos os dias se vê os fatos mudando as leis, nunca o oposto, estas modificando-os. Se as normas não correspondem ao universo social, pior para elas, tornam-se desacreditadas e descumpridas. A legislação de um modo geral, e em especifico a eleitoral, deve guardar correspondência com a sociedade que pretende regular. A anomalia no campo do Direito Penal concorre para a impunidade, contribui para o aumento da criminalidade.
Os candidatos a candidato já discutem os programas de governo, mas para o universo jurídico, não passam de pretendentes a submeterem seus nomes às convenções partidárias. Semana passada o governador de Pernambuco, futuro candidato a Presidência da República, divulgou as linhas do programa com que pretende disputar o principal cargo público eletivo do país.
Uma sugestão válida para o pleito de 2014: juntamente com o registro dos programas dos candidatos em cartório, seria conveniente obter de todos o compromisso ético de cumpri-los, mesmo inexistindo o recall, instituto do Direito norte-americano, que permite os eleitores destituírem os eleitos por infidelidade aos compromissos assumidos na campanha.
Alguns eixos do Programa do governador do Pernambuco chamam a atenção. O primeiro deles é o fim da reeleição para os cargos do Executivo. Trata-se de medida imprescindível, a ser incorporada ao bojo da reforma política desejada pela sociedade brasileira. A reeleição, introduzida no primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso, contrariou a tradição republicana brasileira, que nem a ditadura ousou contrariar. Utilizou-se o pretexto do Plano Real, como se a estabilidade monetária dependesse da reeleição do então mandatário.
À época invocou-se o precedente norte-americano, inserido em outro contexto cultural. As eleições naquele país têm financiamento privado e os aparelhos do Estado não são utilizados na pugna eleitoral. Por aqui, as eleições são bancadas com dinheiro público, gerando da forma como se procedem, graves distorções, desequilibrando a necessária igualdade de condições dos candidatos.
Outros pontos relevantes, ainda na perspectiva da Reforma Política são: a admissão do candidato avulso para a disputa de cargo eletivo; a limitação da doação das empresas aos candidatos; e a Reforma do Estado.
Pelas regras atuais só filiados a partidos políticos podem candidatar-se. O controle dos partidos por grupos oligárquicos impondo a sua vontade a população, a descrença desta em relação as organizações partidárias, torna a medida saudável para a oxigenação da atividade política, carente da legitimação da participação popular.
A limitação da doação das empresas aos candidatos é outra providência proposta para limitar a influência do poder econômico nas eleições, dominadas pelos donos do dinheiro e os marqueteiros das ilusões, criadores das mágicas nos horários da propaganda, com o fito de ludibriar o eleitorado, tratado como mercado consumidor, sem a fiscalização do Procon.
Outro foco é a Reforma do Estado, estabelecendo a meritocracia no serviço público, pela redução dos cargos em comissão e de assessores contratados, valorizando-se a carreira de servidor público. Nela, inclui-se a reforma tributária, redimensionando o pacto federativo, dando efetiva autonomia a governadores e prefeitos. Acabando com a sua triste romaria a Brasília, de pires na mão, pedindo dinheiro ao Presidente da República.
No discurso de lançamento do Programa, asseguraram que o atual pacto de poder está mofado. É a constatação do óbvio. A pergunta crucial é: como o eleitorado terá certeza do cumprimento dessas promessas? Enfim, outros programas virão.