O Maranhão levou quase um ano para aderir à nossa emancipação política, o que ocorreu somente em 28 de julho de 1823. Na verdade, a autêntica batalha para a independência se deu na costa brasileira, mais precisamente nas províncias que tinham ligação direta com a metrópole: Bahia, Pernambuco, Maranhão e Pará. A controvertida participação maranhense é apenas uma breve história, dentro de nossa história maior e mais abrangente. Porém, não o é menos importante e significativa, até pela polêmica que ainda hoje causa a figura de Lord Cochrane entre alguns historiadores brasileiros e, particularmente, os do Maranhão, que não lhe poupam, injustamente, referências depreciativas.
Por Sergio Tamer
Recomendado a D. Pedro I por José Bonifácio, que tomou conhecimento de seus feitos na expulsão dos espanhóis pelos chilenos, Lorde Cochrane é nomeado Primeiro Almirante da esquadra naval brasileira com a missão de debelar os focos de insurgência à independência, recém proclamada. Portugal não aceitava essa ruptura promovida pelo jovem infante, “aquele rapazinho brasileiro” – como lhe denominavam as Cortes. Por isso, a guerra entre Brasil e Portugal, denominada Guerra da Independência, durou entre 1822 e 1825 e foi intensa naquele conturbado período da nossa história. Tinha Cochrane 48 anos quando veio ajudar D. Pedro a consolidar a nossa emancipação política, e aqui ficou entre 1823 e 1825. Bahia, Pernambuco, Maranhão e Pará mantinham laços jurídico-políticos diretamente com Portugal, cumpriam determinações das Cortes de Lisboa, e seriam o alvo da missão Cochrane que partiu do Rio de Janeiro no dia 2 de abril de 1823 comandando a Nau Pedro I com mais de 600 praças.
Na época, São Luís tinha cerca de 12 mil habitantes, a maioria formada por escravos. O controle das ações políticas, econômicas e sociais ficava por conta dos comerciantes portugueses e de seus descendentes que aqui viviam. Eram os “portugueses do Brasil”. Em toda a Província, só havia o julgado do Mearim; e as Vilas eram: Alcântara, Caxias, Guimarães, Itapecuru-Mirim, Monção, Paço do Lumiar, Pastos Bons, São Bernardo, Tutóia, Viana e Vinhais. O Maranhão foi considerado um caso especial, pois como é sabido essa província – e a do Grão-Pará – “nunca haviam feito parte do Brasil colonial e sempre estiveram diretamente subordinadas ao governo português em Lisboa”. Contudo, o juramento de obediência ao Imperador e a adesão maranhense à independência foram realizados em 28 de julho de 1823, sem qualquer luta armada, graças à astúcia e estratégia naval aqui desenvolvida pelo temível Almirante.
Em 20 de setembro de 1823 o Primeiro Almirante encerrou a sua missão no Maranhão, retorna ao Rio de Janeiro onde é recebido entusiasticamente por D. Pedro e pela Assembleia Constituinte. Na ocasião, recebe o título de Marquês do Maranhão e é condecorado com a grã-cruz da Ordem do Cruzeiro do Sul. A seu favor registram-se a expulsão da esquadra portuguesa da costa brasileira e a integração das províncias do Norte e Nordeste ao Império nascente.
Relata VASCO MARIZ que “foram apresados 78 navios e mercadorias no valor de 250.000 libras esterlinas. A chegada ao Rio de Janeiro dessa imensa frota de navios apresados no Maranhão encheu de velas a Baía de Guanabara e causou sensação na capital”. Por sua vez, Cochrane dizia que tinha direito a um determinado percentual, conforme contrato firmado com o Império, sobre todos esses navios apreendidos – fato esse que iria dar origem, um ano depois, às suas desavenças com o governo e sua polêmica cobrança na província do Maranhão.
Desavenças e posicionamentos polêmicos à parte, nas palavras definitivas de Afonso d’E. TAUNAY, o Marquês do Maranhão “foi o primeiro marítimo de seu tempo e o último grande representante de sua escola de tática naval”. A Marinha Real Inglesa inclui Cochrane entre os doze heróis navais na sua história, dizendo: “Cochrane, cedo, estabeleceu reputação como um dos mais audazes e temidos comandantes.” D. Pedro I também se reportou a Lord Cochrane para justificar o título de Marquês do Maranhão que lhe fora outorgado “por altos e extraordinários serviços em benefício do generoso povo brasileiro, que sempre conservará viva a memória de tão ilustres feitos”.
A respeito de sua atuação entre nós, o Embaixador VASCO MARIZ sublinhou: “a ida de Cochrane ao Maranhão e ao Pará foi decisiva para que essas províncias, então subordinadas diretamente a Lisboa, aceitassem reconhecer o Império. D. Pedro I não tinha como submetê-las e, se continuassem como colônias de Portugal, acabariam caindo nas mãos inglesas, e o Brasil perderia o acesso à Amazônia e seria hoje um país bem menor.”
Somente esse fato, que deve ser visto com a grandeza da justiça, o mérito do reconhecimento, e com uma inafastável perspectiva histórica, seria o bastante para justificar a homenagem que falta em São Luís ao “Pacificador do Maranhão” e garantidor de nossa emancipação política.
Salve, portanto, Lorde Cochrane e todos aqueles que com ele se ombrearam na causa da adesão do Maranhão à Independência!
Sergio Tamer é coautor do livro “Lord Cochrane e a Adesão do Maranhão à Independência do Brasil”. SVT Editora, 2023, MA.