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Notícia

Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

C-O-N-S-T-I-T-U-I-Ç-Ã-O, por José Cláudio Pavão Santana…

“No Brasil os fatos estão acontecendo não por causa da Constituição, mas apesar dela. É um cenário tenebroso, em que se subvertem competências e poderes típicos de autoridades, em nome de um espetáculo midiático repleto de “opinismos” e “achismos” ao gosto do freguês…”

 

Por José Cláudio Pavão Santana*

 

Soletrando talvez se possa compreender melhor. Não eu, nem os homens e mulheres a quem se pode creditar bom senso. É necessário soletrar em tempos obscuros.

Vejo com muita tristeza os Poderes da República sem a mínima preocupação em observar as regras do jogo democrático, a partir do manual: a Constituição.

No Brasil os fatos estão acontecendo não por causa da Constituição, mas apesar dela. É um cenário tenebroso, em que se subvertem competências e poderes típicos de autoridades, em nome de um espetáculo midiático repleto de “opinismos” e “achismos” ao gosto do freguês.

Vejam o Congresso Nacional, gestando uma forma de governo paralela ao que foi definido pela Assembleia Nacional Constituinte de 1987-1988 que redemocratizou o país. Parece que a história de sofrimentos pessoais só serviu para produzir indenizações por desaparecidos e torturados. Passado o arroubo constituinte esqueceram que há um contrato político definindo normas de convivência social e política que não podem ser confundidas com regras de Direito ordinário.

Se preferirem, vejam frações do Judiciário, ditando comportamentos e fixando condutas sem qualquer atenção às decisões políticas fundamentais, com atropelos que sequer respeitam a própria fonte de sua legitimidade, obrigando instâncias superiores a desconstruir teses midiáticas e teratológicas, quando não violadoras de decisões pacificadas. Vejam o espetáculo midiático ao confundirem sinal de transparência com a participação em entrevistas e debates.

Vejam frações do Ministério Público, ditando condutas e pretendendo determinar meritoriamente atos administrativos primários, cuja oportunidade é completamente estranha ao desejo de infantes, por que em desalinho constitucional claro.

Vejam a OAB, já aqui por seu Conselho Federal e fracionamentos Seccionais, tão atenta à militância política, com indisfarçável requinte de braço partidário, silente em tantas oportunidades, insuflando comportamentos contra autoridades, mercê de dores pessoais que podem ser compreensíveis historicamente, jamais como finalidade institucional.

Dá pena ver no que os homens transformaram o Brasil durante a sua redemocratização. Mete medo o Direito forjado pela plêiade de especialistas, afoitos autoritários, cuja suposição é de que a democracia resida pura em suas mentes, ungindo-os como profetas da justiça.

É bom lembrar, entretanto, que quando falta o bom senso e é acelerado o compasso da história, sob a ilusão do justo, no mesmo instante haverá nascido o arbitrário. Quando isto ocorre a diferença entre ficar à margem da lei e ser dela marginal é tênue, porque não haverá regra, senão o abuso.

C-O-N-S-T-I-T-U-I-Ç-Ã-O! É preciso que seja pausada a fala, como última tentativa de fazer compreender que por pior que possa ser o quadro institucional do Brasil, e por mais pobre (espiritualmente falando) que os senhores parlamentares em proposições e compreensões, vale mais um Congresso Nacional funcionando, do que cercado por tanques.

Há história, há lembranças, mas há, acima de tudo, Constituição e ela merece respeito.

 

*José Cláudio Pavão Santana é Pós-doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra, procurador do Estado e professor da UFMA.