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CENTRO DE ESTUDOS CONSTITUCIONAIS E DE GESTÃO PÚBLICA

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No País dos Grampos (2) – por João Batista Ericeira

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Há dezoito anos a Associação Nacional de Jornais-ANJ, realizava Seminário para debater as controvérsias entre o Direito à Informação e os direitos à imagem, à honra e à privacidade. Exercia interinamente a Presidência da República o ministro do STF, Marco Aurélio de Mello, que se fez presente à abertura dos trabalhos.Decorridos quase duas décadas os conflitos perduram, acrescendo-se outras inovações.

João Batista Ericeira, professor e advogado, é sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Naquele período, a pré-campanha para a Presidência da República estimulava o clima de denuncismo. Agentes públicos e privados grampeavam telefones, montavam dossiês divulgados para enxovalhar a imagem e a honra dos concorrentes, sem a existência de processo judicial conclusivo de suas culpabilidades.

Recordo que o Ministro da Saúde do governo Collor, Alceni Guerra, foi atingido por um desses documentos forjados, envolvendo a fraude de licitação para a aquisição de bicicletas. Depois comprovou-se tratar-se de falsidade visando atingir a sua inegável imagem de homem de bem, probo e honrado.

 De certa feita, em Brasília, quando advogava para o PFL, perguntei-lhe porque não processava os autores e divulgadores da farsa. Ele respondeu que seria melhor deixar como estava. A maldade o atingira, mas entendeu, processá-los seria jogar mais fogo no palheiro.

Os direitos à imagem, à honra, à boa fama são básicos, essenciais ao ser humano, tutelados pelo artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos do Homem das Nações Unidas, abrigados também pelo artigo 5º, IX, da Constituição Federal. Eles são compatíveis com o Direito fundamental à Informação, de natureza coletiva, de que são titulares todos os cidadãos. Devendo ser exercido com responsabilidade e cautela, indispensáveis à convivência democrática.

Escrevi à época o texto “No País dos Grampos”, explicitando os excessos de mentiras e falsidades decorrentes da prática de grampos, infringindo a privacidade, permitindo a montagem de documentos apócrifos. A luta pela conquista do poder deve se pautar em critérios éticos.

O Ministro do STF Celso de Mello, recém-aposentado, a propósito do tema se manifestou assertivamente: “ o ato de corrupção constitui em gesto de perversão ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe e nem admite o poder que se deixa corromper”.

Se para chegar ao poder se admitir deslizes éticos será o mesmo que aceitar que em lá chegando eles com certeza prosseguirão. A questão não é nova. Na República Velha, foram fabricadas cartas para indispor o Presidente Artur Bernardes com os militares, provocando rebeliões nos quarteis. Após 1930, no governo constitucional de Getúlio Vargas, seus adversários falsificaram documentos para acusar o Presidente de ter firmado acordo com Perón, Presidente da Argentina, objetivando implantar a República Sindicalista. Depois comprovou-se tratar-se de falsificação.

Os meios é que evoluíram. Atualmente não são apenas as cartas e áudios gravados pelos grampos, acrescente-se internet, os computadores, os robôs, sofisticando-se os instrumentos de divulgação de mentiras, agora rotuladas de fake news. É o caso da eleição do Presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, acusado pelos Democratas de ter sido ajudado por Putin, da Rússia, com robôs disparando inverdades. Trump é tido como autor de iguais expedientes.

Na última eleição presidencial brasileira suspeita-se da utilização de computadores para disseminar inverdades, direcionando as intenções do eleitorado. São situações geradas pelas inovações tecnológicas que podem ser usadas para o bem e para o mal. As possibilidades dos grampos restaram ampliadas por novas tecnologias. O que fazer? Cabe ao Judiciário o exame e o julgamento das questões de proteção aos direitos, solucionando os conflitos quando houver impasse de valores entre direitos individuais e coletivos, aplicando sanções aos infratores.

Está claro. Não apenas o Brasil é o país dos grampos, o fenômeno globalizou-se!

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