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Notícia

Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

A Lição da França, por João Batista Ericeira

  

A Lição da França

 

 

João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

 

Em 1958, os franceses após crises sucessivas, seguidas de instabilidade política, de incertezas com as guerras de independência das colônias do norte da África, foram buscar no pequeno vilarejo, Colombey-les-Deux-Èglises, o velho general Charles De Gaulle. O recatado herói nacional da Segunda Guerra Mundial, foi convidado a chefiar o governo.  Dotado de plenos poderes, convocou Constituinte, dotou a França de nova Constituição, até hoje vigente, deu-lhe estabilidade e a configuração institucional atual. De lá para cá, republicanos e socialistas reversavam-se no governo. A escrita desfez-se na última eleição presidencial. Ficaram para a disputa do segundo turno Marine Le Pen, do nanico partido Frente Nacional e Emmanuel Macron, de outro pequeno partido, o “En Marche, ” o provável vencedor da segunda rodada de 7 de maio.

O caso da França é emblemático da crise de representação atravessada pelas democracias, em que se inclui o Brasil. Os partidos políticos não representam a sociedade, que não se vê participando dos atos de governo, seja no Legislativo ou no Executivo. A economia depende de estabilidade política para deslanchar, enquanto o país paralisa pela ineficiência dos serviços públicos, a desindustrialização, o desemprego em massa.

Há quem confunda a reforma política com a eleitoral, esta última bastaria com a aprovação da cláusula de barreira e a proibição de coligação nas eleições proporcionais. Ledo engano. Na origem da crise está o refazimento do pacto político. Este se dará pela revisão da atual Constituição, pela convocação de Constituinte exclusiva. Mas é fato, os remendos eleitorais não serão suficientes para enfrentar a crise do divórcio entre o Estado e a sociedade.

Entre nós não há heróis nacionais, figuras como o general De Gaulle, de elevado espirito patriótico, demonstrado em 1969, em que após plebiscito, comprovado que o povo não mais estava de acordo com suas diretrizes de governo, voltou para o recato de sua casa em Colombey-les-Deux-Èglises. Não lhe faltaram a grandeza de estadista e o espirito cívico e patriótico.

No caso brasileiro não se pede tanto, é bom mesmo que o povo seja o protagonista principal, se requer o mínimo de espirito patriótico, para colocar os interesses do país, do regime democrático, acima de pequenos apetites eleitorais, a serviço da manutenção do poder e de seus privilégios a qualquer preço.

Como prosseguir com mandatários sem credibilidade e leis suspeitas de terem sido aprovadas para atender a conveniências de determinadas empresas e empreiteiras. As primeiras condições para o exercício de funções públicas são confiança e credibilidade.

A defesa da atual Constituição transita por sua revisão, ou convocação de Constituinte exclusiva para a partir dela refazer o pacto político entre a sociedade e o Estado.

Não é adequado criminalizar a política, substituindo-a por gestores e tecnocratas. Trata-se de atividade nobre quando a serviço efetivo dos interesses coletivos. O que vem se designando como tal, nada tem a ver com a verdadeira política. A pretexto de propósitos eleitoreiros, esconde-se a ação criminosa de bandos.

Enquanto isso a Diretora –Gerente do Fundo Monetário Internacional-FMI, a francesa Christine Lagarde, alardeia que o Brasil virou a página, isto é, vem aplicando por inteiro a receita dos bancos: arrocho fiscal, contenção de despesas orçamentárias, redução dos direitos sociais.

O termômetro é a imprensa, que trata apenas dos projetos do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, do teto de gastos e das reformas trabalhista e previdenciária, sem prévia avaliação dos custos socais e políticos resultantes.

 Os franceses deram nas urnas respostas a republicanos e socialistas alternando-se no poder desde a proclamação da República gaullista em 1958. Eles não foram capazes de satisfazer as aspirações do eleitorado, rejeitados nas urnas, substituídos pela extrema direita de Le Pen e pelo centrismo de Macron. Mais que isso, manifestaram insatisfação com o sistema político- eleitoral. É apenas o começo. Precisamos aprender lições com a velha França, fonte da democracia, como hoje se pratica, dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Na República, o que deve prevalecer é o interesse público.