CECGP

CENTRO DE ESTUDOS CONSTITUCIONAIS E DE GESTÃO PÚBLICA

CECGP articula suas tarefas de pesquisa em torno de Programas de Pesquisa em que se integram pesquisadores, pós-doutores provenientes de diferentes países.

A eficácia dos princípios constitucionais nas relações privadas: breves considerações do direito civil constitucional

  

 

 

A eficácia dos princípios constitucionais nas relações privadas: breves considerões do direito civil constitucional

 

 

 

Priscila Fernanda Costa e Silva Dos Reis, advogada, mestranda em Direito Público pela Universidade Portucalense e MBA em Direito Civil e Processo Civil pela FGV-RIO.

 

 

 

 

RESUMO

 

 

 

Com a Constituição da República de 1988, os Direitos Fundamentais passaram a ter uma possibilidade de aplicação e valoração, no qual antes não ocorria. Nesse contexto, a aplicação dos Direitos Fundamentais nas relões entre privados tem gerando espo e reconhecimento nas decisões do Judiciário e na Doutrina. Diante do exposto, este estudo objetivou analisar a aplicabilidade dos direitos fundamentais nas relões entre particulares. Após análise dos trabalhos pesquisados, das referências consultadas concluise que os  institutos  referentes  ao tema, devido à ocupação dos espos públicos por entes privados, surge a preocupação na busca de proteção dos direitos fundamentais. Isto porque, embora o constituinte de 1988 tenha provocado, teoricamente, proteção judicial dos direitos fundamentais, tais recursos tem se demonstrado ineficazes, logo o Estado tem oferecido, apenas, uma garantia de índole institucional, sendo insuficiente para mudança existe na eficácia  de tal dispositivo.

 

Palavraschave: Direito Fundamental.  Direito Privado. Eficia.



 

 

SUMÁRIO

 

 

 

1

INTRODUÇÃO………………………………………………………………………………………… 7

 

2

DIREITOS FUNDAMENTAIS………………………………………………………………….. 9

 

 

2.1

Dimensões do Direito Fundamental …………………………………………………………… 13

 

3

O     DIREITO    PRIVADO    SOB    A    PERSPECTIVA    DO    ESTADO

LIBERAL AO ESTADO CIVIL ……………………………………………………………….. 15

 

 

4

TEORIAS       RELATIVAS       A      APLICAÇÃO       DOS       DIREITOS

FUNDAMENTAIS NAS RELÕES PRIVADAS …………………………………… 18

 

 

4.1

A    teoria    da    eficácia    horizontal    mediata    ou   indireta    dos    direitos

fundamentais ……………………………………………………………………………………………. 18

 

 

4.2

Teoria da aplicação imediata …………………………………………………………………….. 18

 

 

4.3

As teorias alternativas ………………………………………………………………………………. 19

 

 

4.4

A posição doutrinária  e jurisprudência  brasileira ……………………………………… 19

 

 

5

AUTONOMIA PRIVADA E DIREITOS  FUNDAMENTAIS: ponderação

de interesses ………………………………………………………………………………………………. 24

 

 

5.1

Atuação dos direitos humanos nas relações privadas …………………………………. 26

 

6

CONCLUSÃO ………………………………………………………………………………………….. 29

 

 

REFERÊNCIAS ………………………………………………………………………………………. 31

 



 

1  INTRODUÇÃO

 

 

 

Os direitos e garantias fundamentais expressos na Constituição Federal de 1988 estendemse aos particulares, ainda em forma impcita. Sabese que o constitucionalismo clássico envolveria os direitos fundamentais  como  direitos  subjetivos  de  defesa  dos indivíduos exercidos contra o poder do Estado. Ressaltase que a conjuntura no qual nasceu o constitucionalismo foi modificada ao longo da história. Diante das crises  econômicas  e sociais, surgiu na doutrina fértil discussão sobre a temática.

Cumpre lembrar que a evolução da sociedade e das novas regras de conduta, exige que o direito fundamental passe a ser o referencial dos denominados Estados de Direito, onde o indivíduo tem, em face do Estado, não só direitos privados mas também direitos públicos. Nesse sentido o Estado de Direito é compreendido como o Estado dos Cidadãos, no qual a Constituição configurase como o principal marco  delimitador dos direitos, das obrigões e das garantias  fundamentais.

Entretanto, raramente a aplicabilidade tem se tornado efetiva nessa relação entre particulares. Diante disso, através de doutrinas e jurisprudência e princípios inerentes a essa relação é que se torna exatamente necessário o estudo da eficácia dos direitos fundamentais nas relões privadas.

Os direitos fundamentai nã trouxeram  um previsã constitucional  de  um instrumento de garantia de efetivo exercício de direitos fundamentais nas  relões  privadas apesar do legislador constituinte originário não ter  a  intenção  de  afastar  os  direitos fundamentais das relões privadas, sobretudo Constituição Federal de  1988,  traz  no  seu texto, de forma expcita ou não, vários dispositivo dirigidos à proteção dos direitos fundamentais,  cuja efetividade  está voltado ao correto comprimento  por parte dos particulares.

Diante do exposto, chegou a seguinte problemática: existe aplicabilidade dos direitos fundamentais  nas relões privadas?

No decorrer da história dos direitos fundamentais surgem teorias que buscam explicar a possibilidade de aplicabilidade dos direitos fundamentais nas relões privadas. No atual texto constitucional não existe previsão expressa de um instrumento  de  garantia  de efetivo exercício de direitos fundamentais nas relões privadas. Há ainda um agravante que é o aumento de imeros relatos de abusos na relação entre particulares, o que tornase imperioso buscar soluções nessa falta de aplicabilidade dos direitos fundamentais nas relões entre particulares.

A motivação para a realização desta pesquisa ocorre em razão de perceber que raramente se aplica a efetividade dos direitos fundamentais nas relões entre particulares. É com essa concepção que propõese a fazer análise da normatividade constitucional do direito fundamental e da sua efetividade na relação privada, tendo por base o avanço extraordinário da legislação  vigente  que, além de conferir posição privilegiada  a esse direito.

Portanto, este trabalho  objetivou realizar uma analisar a aplicabilidade dos direitos  fundamentais  nas relões entre particulares.

 

A metodologia empregada no estudo foi do tipo exploratório, através de análise literária, crítica e descritiva, com o intuito de maior entendimento do tema em estudo, com leitura de vasta e importante bibliografia, sendo  examinados  os  dispositivos  legais  da Constituição Federal, Código Civil, relacionados  à  matériaAnálise  de  Legislação Previdenciária vigente, assim como uma avaliação da postura adotada pela doutrina e jurisprudência brasileira, a fim de construir bases jurídicas, sociais, psicológicas de conscientização  humana,  sólidas para a conclusão satisfatória  da pesquisa.

A partir dessa abordagem, o trabalho foi  desenvolvido  em  cinco  capítulos distintos, porém interligados entre si. No segundo  capítulo  que  trata  sobre  o  direito fundamental e direito privado, foi devidamente apresentada a sua evolução, o conceito, dentre tais elementos ainda verificouse essencial tratar sobre os princípios e as dimensões. Coube ao terceiro capítulo expor sobre os fatores de transversalidade entre o direito fundamental  e privado. Após essa compreensão, o quarto capítulo se concentra no estudo na atuação dos direitos fundamentais nas relões privadas, demonstrando sua importância no meio jurídico brasileiro.   No quinto capítulo  serão abordadas as considerões finais  do estudo.

 

2  DIREITOS FUNDAMENTAIS

 

 

 

As análises históricas objetivas ou materiais, em relação  às  declarões do séc. XIII manifestaramse na contradição entre o regime da monarquia absoluta, estagnado e degenerado, e uma sociedade nova tendente à expansão comercial e cultural, que se desenvolvia. Sobre esse momento Del Vecchio (apud  BONAVIDES,  2007,  p.  525) acrescenta: Mas as suas exigências vitais eram arrebatadas de fazerse valer diante da legislação e administração; suas atividades eram expostas a arbitrariedades e à  opressão jurídica  e econômica das classes privilegiadas.

Foi à doutrina do direito natural de concepção racionalista fundada na natureza racional do homem que fez nascer o fundamento do poder potico e do Direito Positivo. Era uma doutrina puramente instrumental e lógica que dava nova concepção ao mundo, ao Estado e à sociedade. Surge, a partir de então, o jusnaturalismo que passou a conduzir a sociedade em função de valores e faculdades inerentes por natureza a todo gênero humano, posteriormente fortalecidas  pelo pensamento  iluminista.

No  século  XIX,  esses  valores  foram superados  pelo  processo históricodiáletico das condições econômicas que deram origem ao  desenvolvimentindustrial  e  ao aparecimento do proletariado, dominado pela burguesia capitalista. Foram essas condições materiais da sociedade burguesa que originaram outros direitos fundamentais, os direitos econômicos e sociais.

Vale ressaltar que na Constituição Federal, compõe os direitos sociais, juntamente com os demais dispostos no artigo assim expressos: São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância,  a assistência  aos desamparados, na forma desta Constituição.  (BRASIL, 1988).

Assim, as poticas fundamentais que são apoiadas em direitos sociais tornam obrigatórias e exigem imediatas medidas do Estado para elevar a condição humana  dos titulares  desses direitos.

Toda essa amplitude e transformões que sofreram os direitos fundamentais do homem dificultaram a definição de conceitos sintéticos e precisos de direito. As dificuldades aumentaram, segundo os doutrinadores, em função das circunstâncias do emprego de várias expressões para designálos, tais como: direitos materiais, direitos humanos, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades públicas, garantias fundamentais  e outras.

A primeira referência à direito fundamental, na Carta Constitucional de 1988, está em um artigo específico, que a designa como direito social1. Aliás, a positivação dos direitos sociais foi significativa2 e para se ter a exata medida dessa regulamentação,  basta analisar o conteúdo do que seja direito social.

A afirmação dos direitos fundamentais do homem no Direito Constitucional revestese de transcendental importância, mas não basta que seja reconhecido ou declarado. É necessário garantilo, porque virão ocasiões em que serão discutidos e violados. Rui Barbosa (apud SILVA, 2008) já dizia que uma coisa são os direitos, outra as garantias, por isso devem ser separados no texto constitucional  fundamental.  As  disposições  meramente  declaratórias são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e  as  disposições assecuratórias  são as que agem em defesa dos direitos e limitação  do poder.

A Constituição não estabelece essa regra de divisão,  nem  sequer  adota terminologia precisa sobre as garantias. No título II enuncia: Dos direitos e garantias fundamentais, deixando para a doutrina pesquisar onde se encontram os direitos e as garantias. O capítulo I desse título traz a rubrica Dos direitos e deveres individuais  e coletivos, não mencionando as garantias, mas a doutrina considera boa parte desses direitos constituirse  garantias.  (BRASIL, 1988).

Hesse (apud SILVA, 2008, p. 20)  relata direitos fundamentais visa  reconhecer […] para garantias, que não contém, em primeiro lugar, direitos individuais, ou, que em absoluto, garantem direitos individuais, não obstante estão, porém, incorporados nos catálogo de direitos fundamentais.

Iurconvite  (2007, p. 02) conceitua:

 

 

 

Os direitos fundamentais são também conhecidos como direitos humanos, direitos subjetivos públicos, direitos  do  homem,  direitos  individuais,  liberdades fundamentais ou liberdades públicas. A própria Constituição da República de 1988 apresenta diversidade terminológica na abordagem dos direitos fundamentais, utilizando expressões como direitos humanos (artigo 4º, inciso  II),  direitos  e garantias fundamentais (Título II e artigo 5º, parágrafo 1º), direitos e liberdades constitucionais (artigo 5º, inciso LXXI) e direitos e garantias individuais (artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV).

 

 

 

 

 

1  Art. 6° São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o la zer, a segurança, a previdência, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988).

2  Conforme esclarece Duarte (2003, p.31), o artigo 6° (bem como o 5° e o 7°) da Constituição Federal teve forte influência do Pacto Internacional de Proteção dos Direitos Civis e Poticos e do  Pacto  Internacional de Proteção dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,  ambos  de  1996, bem como de outras  constituições como a Alemã, de 1949,  a Portuguesa, de 1976, e a Espanhola, de 1978.

 

 

 

Os pressupostos dos direitos fundamentais objetivam criar e manter uma vida na liberdade e na dignidade humana. Porém, Paulo Bonavides (2007) entende que é uma concepção bem ampla, pois existem outras mais restritas, mais especifica e mais  normativa como: direitos fundamentais  são aqueles direitos que o direito vigente  qualifica  como tais.

Karl Schmitt (apud SILVA, 2008) estabeleceu dois critérios formais de caracterização dos direitos fundamentais. No primeiro, são designados  direitos  fundamentais todos os direitos ou garantias, nomeados e especificados no instrumento constitucional. O segundo afirma que os direitos fundamentais são  aqueles  que  recebem da  Constituição  um grau mais elevado de garantias ou de segurança, imutáveis ou de mudança dificultada, alteráveis  unicamente  mediante  lei complementar  à Constituição.

Já  Marchinhacki (2012,  p.170)  ressalta  que  os  direitos  fundamentais  de terceira geração:

 

 

[] trazem comnota distintiva fatde se desprenderem, em princípio, da figura do homemindivíduo como seu titular, destinandose à proteção de grupos humanos. A atribuição da denominação de direitos de solidariedade ou  fraternidade  aos direitos da terceira geração, é consequência da sua implicação universal por exigirem esforços e responsabilidades em escala até mesmo mundial para sua efetivação. Entretanto, há quem veja a efetivação desses  direitos  com  certo ceticismo.

 

 

Nesse contexto, os direitos sociais depois de terem atravessado a fase de jurisdicidade, passaram a tornarse tão justifiveis quanto os de primeira geração, com a aplicabilidade imediata  inerentes  aos  direitos  fundamentais.  Referidos  direitos  fizeram nascer à consciência de que tão importante quanto salvaguardar o indivíduo era proteger as instituições que garantem a realidade social, muito mais rica, aberta à participação e à valorização  da personalidade  do cidadão.

Ressaltase que para Mendes e Branco (2012), os direitos fundamentais são elementos integrantes da identidade e da continuidade da Constituição, considerandose, devido a isso, ilegítima qualquer reforma constitucional tendente a suprimilos (art. 60, § ). E os direitos sociais são as liberdades públicas que tutelam (protegem) os menos favorecidos, proporcionandolhes condições de vida mais decentes e dignas compatíveis com a igualdade real.

Funcionam como  legítimas  prestões  positivas, de segunda geração, vertidas em normas de cunho constitucional, cuja observância é obrigatória pelos Poderes Públicos. Nasceram abraçados ao princípio da igualdade, do qual não podem se separar, porque fazêlo equivaleria a desmembrálos da razão de ser que os ampara e estimula (BONAVIDES, 2007).

Tais prestões se configuram como positivas porque revelam um fazer por parte dos sociais. Exemplos: serviços escolares, médicohospitalares, assistenciais,  previdenciários,  desportivos etc. São normas declaratórias de princípios programáticos, que veiculam programas a serem implementados  pelo Estado.

A definição dos direitos sociais acarreta consequências como:  ter  aplicação imediata (art. 5º, § 1º) e o ajuizamento do mandado de injunção ou a ADO (ação direta de inconstitucionalidade por omissão), sempre que houver a omissão do poder público na regulamentação de alguma norma que preveja um direito social, e inviabilize seu exercício (LENZA, 2012).

A partir de então, descobriase um novo conteúdo dos direitos fundamentais: as garantias institucionais. Foi graças às garantias constitucionais que determinadas instituições receberam a proteção para se resguardar de possíveis  intervenções  do legislador  ordinário.

O nascimento desse novo conceito de direito fundamental, vinculado a uma liberdade objetiva, atada a vínculos normativos e institucionais e valores sociais, demanda realização concreta, cujos pressupostos fazem do Estado seu principal artífice. Sobre estes direitos os indivíduos não têm poder propriamente. Os direitos de terceira e quarta geração já consolidados no constitucionalismo contemporâneo não se constituem objeto desta pesquisa, portanto não serão aqui analisados.

No  Brasil,  a  Ordem  Constitucional  protege  a  vida,  a  liberdade,  a  igualdade,  a segurança e a propriedade de todos que a ela estejam subordinados. Nesta Ordem Constitucional,  se incluem os direitos fundamentais.

Os direitos e garantias fundamentais  constam  da  Declaração  Universal  dos Direitos Humanos, aprovados pela Organização das Nões Unidas (ONU), em assembleia reunida em Paris em dezembro de 1948, da qual o Brasil é signatário.

Em certo sentido, é na comunidade internacional, por intermédio da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, que o Brasil se inspirou para elaboração da Constituição Federal de 1988, somandose a isso as exigências da sociedade brasileira nos direitos fundamentais.

Em relação a esses direitos, o Brasil submetese a diversos pactos internacionais. Para exemplificar, só na década de 90, tivemos: a Conferência Internacional de Educação para Todos, Jomtien, Tailândia, 1990; a Declaração de Nova Delhi, Índia, 1993; a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, Cairo, Egito, 1994; a Cúpula Mundial de Desenvolvimento Social, Copenhague, Dinamarca, 1995; a 4ª Conferência sobre a  Mulher, Beijing, China, 1995; a Afirmação de Aman, Jordânia, 1996; a 45ª  Conferência Internacional da UNESCO, Genebra, Suíça, 1996 e a Declaração de Hamburgo,  Alemanha,  1997.

 

Logo, o direito público brasileiro, expressase na faculdade de o individuo exigir da administração pública o cumprimento  da  prestação dos direitos fundamentais assegurados por norma jurídica.

 

 

2.1 Dimensões do Direito Fundamental

 

 

 

Os direitos fundamentais nasceram com a finalidade de assegurar as liberdades individuais das pessoas, exigindo uma ação negativa do Estado, logo é um direito subjetivo. Porém, apesar das origens históricas e seus fins dos direitos fundamentais estarem diretamente relacionadas a uma dimensão subjetiva, questionase se esses direitos possuem também uma dimensão objetiva (MARCHINHACKI, 2012).

Couto (2010) afirma que a dimensão subjetiva dos direitos fundamentais procede da primeira vertente dos direitos modernos, no qual se conclamava a renuncia do Estado em interferir no exercício da liberdade e da igualdade públicas impostos ao indivíduo.  Cumpre lembrar, a dimensão subjetiva, sobretudo do modelo de Estado liberal, compete uma função: de proibir as intervenções do Estado na esfera jurídica individual. O mesmo autor relata ainda que:

 

 

Registrando que o tratamento das  dimensões  ou  efeitos dos direitos fundamentais não é tão simples quando parece, convém esclarecer que a referência a direito subjetivo, conforme acima referido e tentado deixar claro (em simetria ao status negativo, segundo a teoria dos status de Jellinek), não se confunde com direito a prestação (que se aproxima do status positivo, do referido  autor),  vez que  esse último está exatamente em posição contrária ao direito subjetivo clássico. O direito a prestação busca uma ação positiva do Estado de modo a implementar algo em prol do cidadão. Feita essa rápida referência à dimensão negativa do Estado, no que mais interessa ao presente escrito é exatamente a dimensão op osta à exigência de abstenção do Estado frente ao indivíduo. (COUTO, 2010,  p.20)

 

 

Nesse contexto, a dimensão objetiva exacerba o dever de proteção aos direitos fundamentais, no qual incide a máxima da proporcionalidade a considerar o grau do dever de tutela estatal suficiente para cada direito fundamental.  Marchinhacki (2012,  p.  175)  ressalta que:

 

 

Sabese que o direito objetivo é o conjunto de normas de conduta que devem ser observadas por todos, caracterizase como o poder de fazer algo. Já o direito subjetivo possibilita que o indivíduo invoque a norma ao seu favor, envolvendo por isso, pelo menos duas pessoas, onde uma poderá exigir o seu direito e a outra terá a obrigação  de  fazer  cumprir  o direito. Em razão das  origens  históricas  dos  direitos fundamentais, que exigia a não intervenção do Estado nas liberdades individuais, predominou durante muito tempo o entendimento de que o direito fundamental era apenas um direito subjetivo. Entretanto, com o surgimento das novas gerões de direitos fundamentais, especialmente os direitos sociais e coletivos, percebeu se que os direitos fundamentais possuem também uma dimensão objetiva.

 

 

A dimensão objetiva dos direitos fundamentais está associada ao Estado Democrático de Direito de acordo com as constituições democráticas assumem um sistema de valores que os direitos fundamentais revelam e positivam. No Estado Democrático de Direito, os direitos fundamentais servem de norte para a ação dos  poderes  constituídos  impondo limites  e servindo de diretrizes  para os poderes constituídos.

Segundo Fernandes (2014) o Constitucionalismo Social possui caraterística da dimensão objetiva, pois os mesmo complementa a dimensão subjetiva, além de colocar  os direitos fundamentais em um papel importante no ordenamento jurídico. A mesma tem uma função autônoma, que vai além da dimensão subjetiva dos direitos fundamentais, logo seu reconhecimento reforça a juridicidade dos direitos fundamentais, que […] como um conjunto de valores objetivos básicos e fins diretivos da ação  positiva  dos  poderes  públicos(SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2013, p. 308).

Entretanto, Paulo Bonavides (2000 apud MARTINS, 2014, p. 03) alega um vasto rol de consequências da atribuição da dimensão objetiva aos direitos fundamentais, tais como:

a) a irradiação e a propagação dos direitos fundamentais a toda a esfera do Direito Privado; b) a elevação de tais direitos à categoria de princípios, de tal sorte que se convertem no mais importante lo de eficácia normativa da Constituição; c) a eficácia vinculante, cada vez mais enérgica e extensa, com respeito aos três Poderes, nomeadamente o Legislativo; d) a aplicabilidade direta e a eficácia imediata dos direitos fundamentais com perda do caráter de normas programáticas; e) a dimensão axiológica, mediante a qual os direitos fundamentais aparecem como postulados sociais; f) o desenvolvimento da eficácia inter privatos, ou seja, em relação a terceiros (Drittwirkung), com atuação no campo dos poderes sociais; g) a aquisição de um duplo caráter (Doppelcharakter; Doppelgestalt ou Doppelqualifizierung); h)  a  elaboração  do  conceito  de  concretização,  de  grau  constitucional;  i)  o  emprego  do princípio da proporcionalidade vinculado à hermenêutica concretizante, emprego não raro abusivo; e j) a introdução do conceito de précompreensão (Vorverständnis),sem o qual não há concretização.

Diante do exposto, Martins (2014) ressalta que a identificação de normas– princípios  é fundamental para promoção dos direitos fundamentais.

 

 

3      O DIREITO PRIVADO SOB A PERSPECTIVA DO ESTADO LIBERAL AO ESTADO CIVIL

 

 

Conforme a literatura, o Direito Privado está voltado para regulamentação dos interesses individuais e coletivos, corresponde às seguintes áreas: Direito Civil, dividido nas disciplinas direito das obrigões, direito das coisas, direito de família e direito das sucessões; e o Direito Comercial, dividido em Direito das Sociedades ou Empresarial  e  Títulos  de Crédito (ASCENSÃO, 2001).

De  acordo  com Ascensão  (2001)  na  área comum entre as várias disciplinas do Direito Privado, temse a Teoria Geral do Direito Privado, em que se contém, fundamentalmente, o regime das pessoas, dos bens e dos fatos jurídicos, que por  vezes chamada de Parte Geral do Direito Civil, representa o elemento basilar do Direito Privado Moderno, uma vez que constitui o repositório fundamental de conceitos e institutos comuns a seus mais tradicionais ramos, o Direito Civil e o Direito de Empresa, os quais, em uma perspectiva unitarista, encontram  sua  definitiva  comunhão  dogmática  no  direito  das obrigões.

Segundo Soares (2008) os primeiros  códigos  trouxeram  técnicas  legislativas visando gerar regulamentação geral da matéria de Direito Privado, apesar de ainda ter aproximação com o direito anterior. O primeiro substituído em 1900 pelo Código Civil alemão e o segundo ainda em vigor com modificações  inseridas  já no limiar  do séc. XX.

O mesmo autor ressalta ainda que:

 

 

 

O Código de Napolo de 1804 sucedeu o Antigo Regime, construindo reforma legislativa por meida reunião da matéria civilística em único corpo de leis munido das qualidades de clareza, precisão, praticidade dentre outras. Desta feita, influenciando na elaboração dos códigos nacionais do Século XIX na Europa e também nos países latinoamericanos, consagrando o movimento da codificação. Nossa herança cultural do Direito Português reforça a adoção da legislação de Portugal na Brasil Colônia até a Independência em 1822,  de  sorte  que  as compilões legislativas de regência (Ordenões  Afonsinas,  Manuelinas  e Filipinas) tiveram vigência no território que somente as a emancipação jurídica surgiu um movimento para a organização de um Código Civil pátrio. Nesse interregno, as Ordenões Filipinas continuaram em vigor por longo período com modificações pontuais, sendo que a urgência de modernização do nascente direito brasileiro, que demandava sistematização mais adequada à  realidade  social, contribuiu para incutir nos juristas brasileiros o consenso pela necessidade da codificação civil. (SOARES,  2008,  p.15)

 

 

Porém, Jobim (2012) relata que a história do  direito  privado surgiu na  Europa, com a redescoberta do Corpus Iuris justinianeu, sendo está uma ciência jurídica europeia que tem seus inícios na alta Idade Média. Segundo o mesmo autor, a influência do Corpus Iuris justinianeu foi um paradigma ao início de um pensamento que balizaria uma linha jurídica na Alemanha.

 

 

A ‘recepção do direito romano na Europa ocidental e central não constitui senão a expansão espacial deste femeno científico e social. Na Alemanha, a recepção foi muito favorecida, depois de certo atraso inicial, p ela dissolução do poder central real e pela crescente pulverização local e corporativa do direito e  da  jurisdição.  Ao mesmo tempo, porém, o encontro com uma cultura jurídica espontânea pouco tocada pelas influências da antiguidade, provocou aqui uma crise de assimilação mais duradoura que na Europa central e meridional. O resultado foi, por fim, uma supremacia quase completa de uma jurisprudência comum e europeia sobre a realidade social da vida jurídica alemã (JOBIM,  2012,  p. 2).

 

 

Nesse contexto, Leite (2014) afirma que o Código Civil é herdeiro do Direito Romano, disciplinava as relões jurídicas dos dois principais atores  da  vida  civil:  o proprietário e o contratante. Já no segundo momento, diante de alguns abusos devido o individualismo que a legislão civil infraconstitucional permitia, foi necessário a atuação do Estado, visando barrar esses abusos e possibilitando a equiparação das partes no trato negocial.

O mesmo autor ressalta que nasce o denominado Estado Social,  projetado  no Direito Privado, sobretudo através do dirigismo contratual, que se expressava no momento em que o Estado passa a intervir nas relões privadas, através da edição de normas de ordem pública destinadas à proteção do lado mais fraco da relação jurídica.

Não se pode esquecer que o Estado Social tem um caráter complexo, ou seja, ao

 

mesmo tempo direitos individuais e coletivos. O processo de justiciabilidade é assimétrico e, por isso, não logra universalizar os direitos que devem ser prestados pelo Estado. O Supremo Tribunal Federal tem desempenhado, como órgão máximo do Poder Judiciário brasileiro, um importante papel no sentido de estabelecer critérios para a concretização do Estado Social por meio de demandas (MENDES; BRANCO, 2012). Logo, o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a justiciabilidade desse estado, fundamentando suas decisões, basicamente, no postulado da Dignidade  da Pessoa Humana.

Ressaltase        que os         direitos   humanos       resultam           de        um                  movimento          de

 

constitucionalização que comou nos  primórdios  do  século  XVIII.  Encontramse incorporados ao patrimônio comum da humanidade e são reconhecidos  internacionalmente a partir da Declaração da Organização  das Nões Unidas de 1948.

Contudo, foi na Grande Guerra Mundial, que os direitos humanos foram efetivamente  divulgados  e  implantados  de  maneira  expcita  nas  constituições.  Neste  período



 

todos os povos compreenderam que a preocupação internacional deveria estar voltada tanto para a proteção aos direitos da pessoa humana, após as violências ocorridas no período da guerra, como também para o perigo de ameaça à tranquilidade universal decorrente da instabilidade  das relões entre os diversos países.

Cabe enfatizar a explicação dada por Dallari (2004, p. 1213), apontando que a expressão direitos humanos, pode  ser  analisada  como  […]  uma  forma  abreviada  de mencionar os direitos fundamentais da pessoa humana enfatiza ainda que […] esses direitos são considerados fundamentais porque sem eles a pessoa humana não consegue existir ou não é capaz de se desenvolver  e de participar plenamente  da vida..

Diante desse prisma, os Direitos Humanos regulam, as relões entre o Estado e o particular. Portanto, os Direitos Humanos aplicamse às relões privadas, por causa da Constitucionalização dos Direitos Privados, que asseveram ao Estado poder de administração em assuntos particulares. A literatura ressalta ainda que […] tal orientação justificase porque não podem os particulares, com amparo no Princípio da Autonomia de Vontade, afastarse livremente do dever imposto a todos de respeitar os direitos e as garantias constitucionais(SILVA; BONIFÁCIO, 2012, p. 110).

 

4     TEORIAS RELATIVAS A APLICAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA RELAÇÃOES  PRIVADAS

 

 

4.1  A teoria da eficácia horizontal  mediata ou indireta dos direitos fundamentais

 

 

 

Foi desenvolvida inicialmente na doutrina alemã e  tornouse  a  concepção dominante no direito germânico, sendo até hoje seguida pela maioria dos juristas e pela Corte Constitucional Alemã. (SARMENTO, 2006).

Tal teoria,  ainda  que  apresente  a  mesma  gênese  teórica  da  vertente da eficácia imediata, onde os direitos fundamentais, além de estabelecerem direitos subjetivos públicos oponíveis ao Estado, também são uma ordem de valores que irradia  efeitos  em todas  as esferas do direito é tida como uma construção intercessora entre a que meramente nega a conexão dos particulares e aquela que ampara a incidência direta e imediata destes direitos na esfera privada (SARMENTO 2006).

 

4.2  A teoria da aplicação imediata

 

 

 

 

Tal teoria descreve que a aplicabilidade dos direitos fundamentais ocorre de maneira imediata nas duas vertentes desta teoria, ou seja, que da mesma forma como são aplicados nas relões entre o Estado e os cidadãos, são aplicados também nas relões interparticulares,  sem intermediação  legislativa  (SILVA, 2008).

O pensamento acerca da vinculação direta de  particulares  aos  direitos fundamentais teve na obra de Hans Carl (apud SARMENTO, 2006) a sua gênese histórica, onde o autor apresenta a tese de que os direitos fundamentais têm resultados absolutos e, por isso, não necessitam de intercessão legislativa para serem  aplicados  às  relões  entre privados.

Cumpre ainda destacar que, o autor justifica o seu pensamento com  base  na escolha constitucional pelo Estado Social, onde implica no reconhecimento  de  que  as violões aos direitos fundamentais não proveem apenas do Estado, mas também de terceiros em geral, pelo o que compete a incidência deles nas relões privadas no anseio da justiça social material.

Sarmento (2006) acrescenta ainda que, não é imprescindível nenhum instrumento para infiltrálos, como as cláusulas gerais, porquanto possuem natureza de direitos subjetivos dos cidadãos, podendo ser oponíveis  tanto aos poderes públicos  como aos particulares.



 

4.3  As teorias alternativas

 

 

Sobre tal teoria, é de se simples e fácil reconhecimento saber que esta trata de uma variação das teorias acima expostas. De certa maneira podemos subdividir a teoria da eficácia mediata e imediata,  em teoria dos deveres de proteção e na teoria da convergência  estadista.

Assim, a teoria dos deveres de proteção consiste em afirmar que os sujeitos de Direito Privado não são destinatários de normas dos direitos fundamentais, enfatizando ainda, que o Estado além de obrigado a absterse de violar os direitos fundamentais, também deve protegêlos diante de possíveis  lesões provenientes  de particulares  (SARLET, 2006).

Portanto, os deveres de proteção estão consubstanciados na  obrigação  do legislador, tanto ao fazer as leis reguladoras das relões jurídicoprivadas, quanto ao juiz, ao resolver o conflito  entre particulares.

Há quem defenda a referida teoria, assumindo que está é preferível em relação às outras, pois, ao direcionar os direitos fundamentais apenas para o estado, impede uma interposição à autonomia privada e, como resultado, no temse o esvaziamento do Direito Privado, além de evitar a outorga exagerada de poder ao Judiciário.

Sarlet (2006) persiste ainda no argumento de que não se pode meramente eliminar os particulares como destinatários de direitos fundamentais nas relões estabelecidas entre si, o que configuraria óbvia contrariedade à disposição constitucional da eficácia imediata dos direitos fundamentais, além de que auferir ao Estado o dever de proteção acabaria por lhe conferir  atribuições  excessivas  que, por vezes, não seriam desincumbidas.

Por sua vez, a teoria da convergência estadista imputa as violões aos direitos fundamentais diretamente ao Estado, ou seja, não há uma equiparação entre o ato praticado pelo privado ou pelo público, mas o entendimento de que a responsabilidade de qualquer ato violador de direitos fundamentais  é estatal.

 

 

4.4  A posição doutrinária e a jurisprudência  brasileira

 

 

 

Está disposto no ordenamento pátrio, a eficácia dos direitos fundamentais entre particulares, no qual garante ao indivíduo o pleno exercício de seus direitos fundamentais, ressaltando que não se deve ser exercido com abuso de direito. Minholi  (2012)  cita  o Recurso Extraordinário 201.8198, que analisou à eficácia dos direitos fundamentais nas relões privadas, no qual a União Brasileira de Compositores (UBC) inseriu recurso extraordinário com a finalidade de reforma do acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio  de  Janeiro,  invalidando  o  ato de exclusão de associado, por não ter conferido a ele o principio  constitucional  da ampla defesa, como se pode observar abaixo:

 

 

EMENTA:  SOCIEDADE  CIVI SE FIN LUCRATIVOS UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES.  EXCLUSÃO  DE  SÓCIO  SEM  GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DCONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCI DO DIREITO FUNDAMENTAI NA RELAÇÕE PRIVADAS.

As  violões  a direitos  fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relões

entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relões  travadas  entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS    PRINCÍPIOS    CONSTITUCIONAIS    COMO    LIMITES    À    AUTONOMIA

PRIVAD DAS  ASSOCIAÇÕES.  A  ordem  jurídico constitucional  brasileira  não

conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteçãàs liberdades e garantias fundamentais. O espo de autonomia privada garantido pela Constituição às associões não está imune à incidência dos princíp ios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomiprivada, que encontra claras limitões de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois  a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se imem, aos particulares, no âmbito de suas relões privadas, em tema de liberdades fundamentais.  III.  SOCIEDADE  CIVIL  SEM  FINS  LUCRATIVOS.  ENTIDADE QUE  INTEGRA  ESPAÇO  PÚBLICO AIND QU NÃOESTATAL. ATIVIDADE  DE  CARÁTER  PÚBLICO.  EXCLUSÃO  DE  SÓCI SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. APLICAÇÃO DIRETA DOS DIREITO FUNDAMENTAI À   AMPL DEFES E  AO  CONTRADITÓRIO.

As  associões  privadas que exercem função predominante em determinado âmbito econômico e/ou social, mantendo seus associados em relões de dependência econômica e/ou social, integram o que se pode denominar de espo público, ainda que nãoestatal. Supremo Tribunal Federal Diário da Justiça de 27/10/2006 RE 201.819 / RJ A União Brasileira de Compositores UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do  ECAD  e,  portanto, assume posição  privilegiada para determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devidprocesso constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas obras. A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício profissional de seus sócios legitimam, no cas o concreto, a aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV   LV CF/88) IV RECURSO  EXTRAORDINÁRIO   DESPROVIDO (STF  RE: 201819 RJ, Relator:  ELLEN  GRACIE,  Data  de  Julgamento:  11/10/2005, Segunda Turma, Data de Publicação: DJ 27102006).  (BRASIL,  2006).

 

 

Na época do recurso, a exministra Ellen Gracie era relatora, deu provimento ao recurso, alegando que as associões privadas tem autonomia para desenvolver suas regras e os associados tem que seguir tais normas, contudo considerando o cumprimento do estatuto, o associado não poderia ter seu título anulado. Diante do  exposto,  Minholi (2012,  p.  20) afirma que no constitucionalismo clássico, incabível seria a evocação  dos  direitos fundamentais  para a solução de um conflito  entre particulares.

Nesse contexto, existem na literatura  outras  jurisprudência  acerca  da  incidência dos direitos fundamentais nas relões entre particulares. Como podemos observar na jurisprudência o Recurso Ordinário, RE 158215 RS, relatado pelo Min. Marco Aurélio,  o Pretório Excelso proferiu que ato de exclusão praticado no âmbito de entidade privada não se sonega à observância do direito fundamental,  logo visa assegurar a ampla defesa:

 

 

DEFESA DEVIDO PROCESSO LEGAL   INCISO  LV  DO  ROL  DAS GARANTIA CONSTITUCIONAI –   EXAM –   LEGISLAÇàCOMUM A

intangibilidade  do  preceito  constitucional  assegurador  do  devido  processo  legal

direciona ao exame da legislação comum. Daí a insubsistência da óptica segundo a qual a violência à Carta Potica da República, suficiente a ensejar o conhecimento de extraordinário, há de ser direta e frontalCaso a casocompete ao Supremo Tribunal Federal exercer crivo sobre a matéria, distinguindo os  recursos protelatórios daqueles em que versada, com procedência, a transgressão a texto constitucional, muito embora tornese necessário, até mesmo, partirse do que previsto na legislação comum. Entendimento  diverso  implica relegar à inocuidade dois princípios básicos em um Estado Democrático de Direito o da legalidade e do devido processo legal, com a garantia da ampla defesa, sempre a pressuporem a consideração de normas estritamente legais. COOPERATIVA EXCLUSÃO DE ASSOCIADO    –    CARÁTE PUNITIV –   DEVID PROCESS LEGAL Na hitese de exclusão  de associado  decorrente de conduta contrária aos estatutos, imese a observância ao devido processo legal, viabilizado o exercício amplo da defesa. Simples desafio do associado à assembléia geral, no que toca à exclusão, não é de molde a atrair adoção de processo sumário. Observância obrigatória do próprio estatuto da cooperativa.  (STF   RE: 158215 RS, Relator: MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 30/04/1996, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ  07061996).  (BRASIL,  1996).

 

 

As jurisprudências brasileiras reconhecem o meio de defesa ineo dos direitos fundamentais, não visando a individuo/Estado, como já foi falado no capítulo anterior, mas também, sua na relação entre particulares. Sabese da autonomia privada, no qual suas limitões  encontramse  na  ordem jurídica,  não  pode ser exercida com prejuízo aos direitos e garantias de outros entes impostas pela Constituição Da Republica Federativa do Brasil (MINHOLI, 2012).

Podese citar outra jurisprudência,  ocorrida  entre  funcionário  brasileiro  e  a empresa rea Air France, no qual o recorrente contestava o direito à isonomia salarial em relação aos empregados de origem francesa, ocasionando Supremo  Tribunal  Federal  a declarar a eficácia do direito fundamental à igualdade  naquela relação entre particulares:

 

CONSTITUCIONAL.

TRABALHO.

PRINCÍPIO

DA           IGUALDADE.

TRABALHADOR

BRASILEIRO

EMPREGADO

DE       EMPRESA

ESTRANGEIRA ESTATUTO D PESSOA DESTA:  APLICABILIDADE  AO TRABALHADO ESTRANGEIR E  A TRABALHADO BRASILEIRO C.F.,

1967, art. 153, § 1º; C.F., 1988, art. 5º, caput. I. Ao recorrente, por não ser frans, não obstante trabalhar para a empresa francesa, no Brasil, não foi aplicado o Estatuto do Pessoal da Empresa, que concede vantagens aos empregados, cuja aplicabilidade seria restrita ao empregado de nacionalidade francesa. Ofensa ao princípio da igualdade: C.F., 1967, art. 153, § 1º; C.F., 1988, art. 5º, caput). II. A discriminação que se baseia em atributo, qualidade, nota intrínseca ou extrínseca do  indivíduo, como o sexo, a raça, a nacionalidade, o credo religioso, etc., é inconstitucional. Precedente do STF: Ag 110.846(AgRg) PR, Célio Borja,  RTJ  119/465.  III.  Fatores que autorizariam a desigualização não ocorrentes no caso. IV. R.E. conhecido e provido (STF RE 161243/DF 2ª Turma Rel. Min. Carlos Velloso DJ 19/12/1997).  (BRASIL,  1997).

 

 

Nesse contexto, podemos ressaltar também a Apelação Civil do Tribunal  de Justiça do Rio Grande do Sul.

 

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA. SOCIEDADE COOPERATIVA. ASSEMBLEIA GERAL EXTRAORDINÁRIA. ALTERAÇÕES ESTATUTÁRIAS. MODIFICAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE PARA OCARGOS DIRETIVOS  DA SOCIEDAD COOPERATIVA LIMITE DA   AUTONOMIA   PRIVADA. EFICÁCIA DOS DIREITOSFUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES ENTRE PARTICULARES. REVISÃO JUDICIAL DO TEOR DAS DELIBERAÇÕES DA ASSEMBLEIA           GERAL           EXTRAORDINÁRIA.           AFERIÇÃO           DE

PROPORCIONALIDADE. 1 As  violões  a  direitos  fundamentais  não se verificam

tãosomente no âmbito das relões entre o indivíduo e o poder es tatal: ocorrem, também, no contexto das relões entre particulares, razão pela qual os direitos fundamentais , mormente aqueles assegurados pelo texto constitucional, também se destinam à proteção dos particulares, em face dos poderes privados. 2- Decorrência lógica da constatação de que os direitos fundamentais produzem efeitos também nas relões entre privados é a possibilidade de apreciação, pelPoder Judiciário, do teor das deliberões tomadas, por organizões de particulares, no exercício de seu poder de autogestão, em prejuízo de direitos fundamentais de que sejam titulares os seus membros, sem que tal configure afronta ao princípio da autonomia privada, do qual constitui consectário a autonomia das associões  lato  sensu  consideradas, entre as quais as sociedades cooperativas. 3- A nova redação do Estatuto Social da cooperativa ré ofende o conteúdo básico do direito dos cooperativados a concorrer a Presidente e a VicePresidente do Conselho Administrativo, ao  exigir  que,  para tanto, ocupem, antes, outros 03 (três) cargos diretivos, quais sejam, Coordenador de Núcleo, Conselheiro Fiscal e Conselheiro Administrativo. Alteração dos critérios de elegibilidade que limita de modo desproporcional o direito a ser votado, considerado o postulado da proporcionalidade em sua tríplice partição: (a) necessidade; (b) adequação; e (c) proporcionalidade em sentido estrito. Não atendimento  aos elementos da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. (TJRS AC: 70047611736 RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Data de Julgamento: 06/06/2013 Décima  Segunda  Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 10/06/2013).  (RIO  GRANDE  DO SUL,  2013).

 

A interpretação acima exposta vai ao encontro da eficácia horizontal imediata dos direitos fundamentais (direito ao lazer e à desconexão), fazendo jus o reclamante ao tempo à disposição sempre que ficou em sobreaviso. A decisão abaixo, nos revela que a conduta foi relevantemente ofensiva aos direitos da coletividade, sendo favorável à eficácia horizontal dos diretos:

 

 

DANO MORAL COLETIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.  TRABALHO  EM CONDIÇÕES DEGRADANTES. TERCEIRIZAÇÃO. FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. RESPONSABILIZAÇÃO  DA  EMPRESA  TOMADORA  DO SERVIÇOS. CONDUTA         RELEVANTEMENTE        OFENSIVA        A        DIREITOS        DA

COLETIVIDADE.  INDENIZAÇÃO  DEVIDA.  1)   livre  iniciativa  é  fundamento

do Estado Democrático de Direito, e sua coexistência com o valor social do trabalho, no inciso IV, do art. 1º, da Constituição, revela que a atuação da empresa deve ser norteada pela finalidade social, pois o lucro não é um fim em si mesmo ou bem que se possa alcançar abstratamente, uma vez que, como todas as coisas humanas, deve retirar a sua matéria da sociedade, que institui a convivência entre os homens e orientase pela realização do progresso e bem estar da coletividade. 2) O contrato de terceirização não ocasiona a isenção da responsabilidade da empresa que transfere a atividade de que necessita para expandir a sua prestação de serviços, pois se a redução de custos permite a ampliação de seus investimentos, ela não pode excluir a eficácia horizontal dos direitos fundamentais nem retirar a obrigação constitucional de cumprir com a sua destinação social. 3) Comprovada nos autos a conduta relevantemente ofensiva a direitos  da coletividade, bem como ao princípio da dignidade da pessoa humana, deve ser parcialmente deferida a indenização por dano moral coletivo postulada pelo  Ministério  Público do Trabalho, a ser revertida em favor do Fundo de Amparo ao Trabalhador, n os termos previstos nos arts. 13 da Lei  7.347/85,  e  11,  V,  da  Lei  7.998/90.  (TRT1   RO:  00679007620045010302  RJ,

Relator:  Rogerio  Lucas  Martins,  Data  de  Julgamento: 08/07/2015,    Sétima  Turma,

Data de Publicação: 16/07/2015) (BRASIL,  2015).

 

 

Apesar da exposição acima revelada, é válido destacar que, a importância que se dá ao fenômeno do poder privado para a defesa dos direitos fundamentais nas  relões privadas não implica dizer que estes direitos se sobreponham apenas nas relões com tendência desigual, mas, sim, que  a existência de uma relação assimétrica, pela presença de um poder privado, é um elemento  a ser observado.



 

5  AUTONOMIA PRIVADA E DIREITOS FUNDAMENTAIS: ponderação de interesses

 

 

 

Cumpre sopesar nesse capítulo que, se não há prerrogativas  dos  direitos fundamentais sobre a ordem jurídicoprivada por certo, havemos de considerar que também não há como negligenciar a existência de fortes motivos a sustentar uma natureza qualitativamente  diferenciada.

Retomando o critério dos destinatários para  pormenorizar  as  normas  definidoras que dão a distinção entre o direito fundamental e o direito privado, isto é, daqueles que se encontram vinculados (na condição de  obrigados),  percebe-se,  algo  que  curiosamente  ainda não tem sido satisfatoriamente enfrentado no seio da doutrina constitucional, qual seja a distinção entre denominada eficácia vertical e horizontal dos direitos fundamentais  no âmbito do Direito Privado. No entanto, tal distinção, tal elemento será oportunamente destacado nos capítulos  seguintes.

O  que se observa é que, dentro do propósito transversal proposto pelo presente

 

capitulo, surge o binômio – direito publico e direito privado. No entanto, apesar dessa visão clássica do entendimento destes direitos, cabe esclarecer aqui que, não há como fugir da necessidade de se proceder a nova delimitação, já que não se poderá desconsiderar a existência  de um aspecto material e processual do problema4  (SARLET, 2006).

Ainda  sobre  a investigação da problemática que envolve os direitos fundamentais e sua eficácia no campo das relões privadas, também há de se considerar que o rol dos direitos fundamentais é acessível, existindo  os  direitos  fundamentais  atípicos5,  que,  mesmo não elencados explicitamente dentro do corpo da Constituição, são detentores de fundamentalidade tanto quanto os que estão taxativamente  dispostos.  Nesse intento, também cabe questionar se somente os direitos fundamentais expcitos seriam apliveis nas relões privadas, ou se também se pode considerar validas as relões advindas dos direitos fundamentais  implícitos.

 

 

 

3  Acerca do aspecto material, destacamos a problemática da existência, ou não, de uma conexão entre os sujeitos particulares aos direitos fundamentais, bem como de averiguar qual a magnitude e a forma como essa conexão ocorre.

4  Sobre o aspecto processual, tratase dos meios processuais que tornam efetivos os direitos fundamentais nas relões interprivadas, proporcionando especial destaque, a dificuldade da possibilidade do particular, via ação judicial,  oporse diretamente a eventual violação de direito fundamental seu por parte de outro particular.

5  A doutrina aceita outras nomenclaturas identificando também como sendo os direitos fundamentais apenas não redigidas expressamente no local específico do texto constitucional destinado  aos  direitos  fundamentais, dentre elas: direitos fundamentais materiais não formais, direitos fundamentais sem assento  constitucional, direitos fundamentais não enumerados, direitos fundamentais não positivados, direitos fundamentais extravagantes, direitos fundamentais  atípicos etc.

 

 

O pensamento dominante entre os  estudiosos do constitucionalismo é de que há um rol exemplificativo dos direitos fundamentais. Este pensamento ganha notoriedade quando são observadas diversas alterões constitucionais aditivas,  modificações  estas  que  são praticadas com o intento de acolher, novas  conquistas  da  coletividade,  ganhos  estes decorrentes de mudanças sociais, culturais, poticas ou econômicas (MARTINSCOSTA, 2006).

A fundamentalidade originou a abertura do rol constitucional para direitos materialmente fundamentais e que ainda não foram positivados. O que se  percebe sinteticamente, é que existe um progresso do elenco de direitos que apresentam esta natureza jurídica.

Toda  essa  preocupação  em  dispor  acerca  da  nomenclatura  e  característica  da

 

fundamentalidade se mostra relevante para o presente estudo, por que foi justamente  o acúmulo progressivo de direitos fundamentais e das nomenclaturas e características destes que propiciou a sua ocorrência nos seios das relões entre os particulares  (GONÇALVES, 2007).

Contudo, as diversas terminologias acima apresentadas são ainda consideradas secundárias, uma vez que, o que se faz realmente essencial é a uniformidade doutrinária e jurisprudencial no sentido de acolher a ideia de constante inserção do rol dos direitos fundamentais. A partir desta incontestável conclusão, que trata do rol aberto dos direitos fundamentais, é que o trabalho ora apresentado, pretende discorrer sobre a  incidência  dos direitos fundamentais  nas relões privadas.

Gonçalves  (2007)  nos  aponta  outro  elemento  determinante  para  a  validade  dos

 

direitos fundamentais no trato entre os particulares diz respeito à tese, hoje atuante, de que eles apresentam duas dimensões a saber: a) a dimensão subjetiva, que é clássica, incidindo na abstenção do estado de intromissão na vida dos cidadãos (os direitos  fundamentais  como direitos de defesa) e; b) a dimensão objetiva, apresenta o cunho prestacional, onde cabe ao Estado não apenas respeitar os direitos intrínsecos ao seu elemento subjetivo (povo), mas também deve evitar que quaisquer  outros indivíduos  o façam.

Revelase a intenção de citar a transversalidade dos Direitos Fundamentais e Direitos Privados na busca de uma constante aprendizagem na área de conhecimento, principalmente analisando os seus reflexos como ponto estratégico diante do exercício e da eficácia  dos direitos fundamentais  nas relões privadas (GONÇALVES, 2007).

Para entender transversalidade citada no presente trabalho, basta afirmar que o assunto Direitos fundamentais, perpassa muitas outras áreas do direito, e que  entendese também  como  uma  forma  ampla  de  trabalhar  os  Direitos  fundamentais.  É  inegável  que  o estudo dos direitos fundamentais tem merecido, da doutrina constitucionalista, um papel de relevo. É igualmente inegável que um dos fatores primordiais para este destaque é a sua expansividade e a conseguinte necessidade de se tecer considerões sobre os  novos” direitos fundamentais.

 

 

5.1 Atuação dos direitos humanos nas relações privadas

 

 

 

No presente capítulo, farseá uma pontual abordagem sobre um tema relevante para o estudo apresentado atuação dos direitos Humanos da nas relões privadas.

O tema em questão terá como base uma concepção hermenêutica do Direito, onde interpretação e aplicação estão intrinsecamente ligadas, fazendo parte do processo de concretização  do Direito e somente sendo possíveis  diante do caso concreto e de seu contexto.

Farseá, num primeiro momento, uma abordagem sucinta do tema para, em seguida, tratar da eficácia dos direitos fundamentais nas relões privadas, finalizando com a demonstração das jurisprudências  acerca deste tema.

Se  faz  oportuno  fazer  ainda  breve  explanação  sobre  o  emprego  da  expressão eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas.  Esta  expressão  de  nota,  a afirmação de que esses direitos conectam também os sujeitos privados; ou seja,  em linhas gerais cabe dizer que, esses direitos são passíveis de serem invocados e aplicados em determinada  situação em que não esteja presente o poder estatal.

Ainda é   oportuno               esclarecer             que a          dificuldade         da          eficácia       dos          direitos

fundamentais em relões privadas não se  configura  sempre.  Esta  situação  só  ocorre realmente como tema em algumas situões, em outras, estes direitos são aplicados nas relões privadas sem maiores questionamentos.  Cumpre  salientar,  por  outro  lado,  também em certas circunstâncias, que não é cabível falar dos direitos fundamentais nas relões privadas, sequer da eficácia  deles.

Acerca do exposto acima, se faz pontual exemplificar que, há alguns direitos fundamentais que, não resta duvida sobre sua aplicabilidade nas relões privadas. Assim, podemos citar: a situação em que ocorre indenização por dano moral e o inevitável direito de resposta (inciso V do art. da CF de 1988); outro exemplo clássico trata da maior parte dos direitos fundamentais dos trabalhadores, como o gozo de  férias  anuais  remuneradas  (inciso XVII do art. 7º da CF de 1988). Já em outras situões, existem direitos fundamentais que somente são aplicados ao Estado,  não havendo qualquer possibilidade de um privado violar tais  direitos.  Exemplificando:  a  proibição  de  juízo  ou  tribunais  de  exceção  e  o  direito  do brasileiro nato de não ser extraditado (previstos respectivamente nos incisos XXXVII e LI do art. 5º da CF de 1988).

Diante da sucinta explanação é necessário contextualizar em que situação se encontra a violação dos direitos fundamentais. O questionamento que se faz é como proteger a pessoa humana diante do poder, se ocorrer arbitrariedade. O que se encontra como resposta a tal questionamento está  diretamente  relacionado  ao  caráter  histórico  desse elemento. A arbitrariedade do poder apresentase de maneira distinta ao longo do processo histórico e, sendo assim, a forma de se proteger a pessoa humana também terá que levar em conta os momentos  históricos  em que ocorreram.

Sobre essa afirmação exposta acima, cumpre ainda expor que os intérpretes e aplicadores do Direito paulatinamente tomam consciência das mudanças que dão ensejo ao contexto atual que mostram que o fenômeno do poder nem sempre estão ligados à esfera estatal, cabendo, assim, a novos sentidos para os direitos fundamentais, que são considerados como trunfos  frente ao poder.

Os legisladores não podem se fixar no pensamento liberal dos direitos fundamentais, que solidificou o  sentido  desses  direitos  impedindo privandoos de fundar não só as relões individuoEstado, mas, também, as relões entre privados. Ora, o  que  se percebe é que a doutrina e a jurisprudência têm verificado que, em muitos momentos, não é o Estado o opositor frente aos direitos  fundamentaismassimsujeitos  privados, especialmente quando estão dotados de poder (social ou econômico) que se apresentam como inimigos desses direitos. Apesar disso, se pensarmos que as sociedades e  Estados Democráticos de Direito apresentam certo cunho social, o Estado jamais deve  atuar  como inimigo e sim como uma espécie de protetor dos direitos fundamentais,  mesmo  porque  a maioria  destes direitos apenas se realizam por meio da intervenção  estatal.

Após tais assertivas, sobre a propositura de que sujeitos privados podem ser potenciais inimigos dos direitos fundamentais cresce a preocupação quando o fenômeno da globalização, sob o caráter neoliberal, confere sérias restrições ao poder estatal e aumenta, de forma gradual, o poder das grandes entidades privadas. Cabe frisar, que o poder, nas sociedades capitalistas, pode ser caracterizado como a capacidade que um sujeito tem de restringir ou eliminar a liberdade de outra pessoa, não se encontra limitado apenas no Estado, mas sim está revelado nas diversas relões sociais.

É de se ter presente a lembrete que Machado (apud BRIGIDO, 2013) nos faz na introdução à obra Microfísica do Poder, de Michel Foucault, onde o autor afirma que Foucault, com sua genealogia do poder, evidenciou a escassez da ciência potica ao limitar ao Estado sua investigação sobre o poder. O autor ainda enfatiza que Foucault tornou evidente uma relação de antítese entre Estado e poder, comprovando várias relões de poder (poder é relacional) que não são absorvidas ou criadas pelo Estado, apresentandose assim, como uma das formas mais características  de aparecimento  do fenômeno  do poder nas relões sociais.

Enfim, cumpre enfatizar que o poder sempre esteve presente nas relões privadas do capitalismo, muito embora, com as recentes mudanças econômicas e sociais esse poder privado tenha se expandido e acentuado sua capacidade de conduzir condutas públicas e privadas.

No  entanto,  apesar  dessa  pretensa  condução”  das  condutas,  o  Estado  vem demonstrando sinal de enfraquecimento. Contudo, este enfraquecimento de seu poder na atualidade não pode dar pauta pra possíveis escusas, ou seja, não exclui a responsabilização do Estado nos casos de não proteção dos direitos humanos.

Aliás, esta responsabilidade coexiste ainda que haja qualquer tipo de violação dos direitos humanos praticados por agentes não estatais. Enfim, o crescente poder das empresas privadas, bem como a fragilização da soberania estatal, faz com que sejam exigidas novas estratégias para a proteção dos direitos humanos e fundamentais. Isso não afasta o dever de proteção dos Estados, mas, por outro lado, não atrela exclusivamente o Estado, mas também os privados, principalmente  os mais poderosos.

 

6 CONCLUSÃO

 

 

 

No transcorrer do trabalho, analisamos  os  direitos  fundamentas  e  sua  aplicação nas relões privadas, haja vista que a própria Constituição Federal de 1988,  intitula  um capítulo específico sobre direitos e garantias fundamentais, assim  como  em  outros  tópicos dessa constituição.

Em tempos nos quais muito se tem debatido sobre a real efetividade do provimento jurisdicional, sobremaneira quando se está diante de tutelas que envolvam direitos constitucionais fundamentais em relação ao direito privado, em  todas  as  suas  dimensões, passa a ocupar espo de  destaque nos cenários doutrinários e jurisprudenciais. Isso posto, tem o direito fundamental desde a proclamação da Constituição Federal de 1988, e do sistema infraconstitucional vigente, a efetiva tutela de dever do Estado  assegurado  o  comando  em vários dispositivos  da Lei Maior como direito público subjetivo.

Todavia,  deve  se  constatar  a  ponderação,  à  análise  de  um  caso  concreto, aperfeiçoandose sob o modelo do princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que enquanto fundamento dos direitos do cidadão, não deve ser somente interpretado, mas essencialmente,  concretizado.

O problema da eficácia  dos  direitos  fundamentais  se  revela  especialmente delicado quando se trata de avaliar em que medida é possível, por intermédio do Poder Judiciário, impor ao Poder Público uma prestação  diretamente  fundada  na  Constituição,  ou seja, quando se cuida de verificar a eficácia dos direitos fundamental na condição de direitos originários a prestões, de uma prestação não  previamente  assegurada  por  lei infraconstitucional e/ou disponibilizada no sistema de bens e serviços por força de  poticas públicas já existentes.

O Direito Civil alguns exemplos de conflitos de interesses no  âmbito  dos direitos fundamentais. Existindo, numa relação contratual, conflito entre a autonomia  da vontade e um direito fundamental, existirá, um conflito que deverá ser resolvido pela ponderação de valores.

Nesse  contexto,  deve  ser  reconhecido  e  ponderado  os  princípios  constitucionais em face da autonomia da vontade, sobretudo naquelas hiteses em que não houver expressamente previsão na Constituição Federal de 1988, quando se tratar de situação de aparente desigualdade econômica entre os particulares, como condição na qual exista uma preponderação de fato ou de direito, com o fim de afrontar os direitos fundamentais.



 

Diante do exposto, observase que  existe  aplicabilidade  de  direitos fundamentais nas relões  privadas,  ainda  que  de  forma  insipiente,  aplicado  restritamente  em jurisprudências e que ainda deve ser incidido e ampliado de forma a atender as partes envolvidas, seja entre particulares e o Estado, seja entre os  particulares,  reafirmando  os valores da dignidade  da pessoa humana.

Concluise que já não existe mais uma delimitação entre o direito constitucional e o direito privado, não sendo mais admitido como uma divisão e impedimento, já que ultrapassado o limite que os separavam, os direitos  constitucionais  decididamente  abrangem todo o direito.

Sugerese a realização de outros estudos com temática, pois necessita de maiores informões, visto que este trabalho se limitou em uma revisão bibliográfica. A presente sugestão é também uma forma de garantir aos futuros  operadores  do  direito,  maior desenvoltura  e segurança no trato com o público.



 

REFERÊNCIAS

 

 

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