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Notícia

Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

João Batista Ericeira faz uma releitura da história política do Brasil e adverte: “Lembrai-vos de 1937!”…

 Lembrai-vos de 1937!

 

 

João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

 

 

Na abertura da Assembleia Geral da ONU, o Presidente da República assegurou que na América do Sul não há mais espaço para alternativas à democracia. Anos atrás, em 1961, Juscelino Kubitscheck ao transmitir o cargo a Jânio Quadros, afirmou também que deixava a democracia definitivamente consolidada no Brasil. Três anos depois, as tropas saíram de Minas Gerais, em 31 de março de 64, sob o comando do general Mourão Filho, para depor o presidente João Goulart, interrompendo a experiência de Estado de Direito, inaugurada em 1946, pela Constituição promulgada no mesmo ano.

O golpismo pairava no ar desde o ano anterior. Conspiravam a oposição, aliados do governo, todos movidos pela obsessão de chegar ao poder nas eleições presidenciais de 65. Um dos candidatos era Juscelino Kubitscheck, que pretendia retornar para completar a sua obra, dizia, iniciada com a inauguração de Brasília. Seu principal opositor, Carlos Lacerda, temendo a repetição da vitória da aliança PSD-PTB, tramava nos quarteis. Era uma das vivandeiras a que   se referia o general Castelo Branco, rondando as guarnições a procura de soluções castrenses para impasses políticos.

Acusavam o então presidente João Goulart de trabalhar pelo adiamento das eleições e prorrogação do mandato. Repetiam o slogan “Lembrai-vos de 1937”, para recordar o golpe militar de 10 de novembro daquele ano, dado por Getúlio Vargas, abolindo a Constituição de 1934, impedindo a realização das eleições presidências de 1938, em que se candidatavam José Américo de Almeida, Armando Sales de Oliveira e Plinio Salgado.

Dias antes do golpe de 10 de novembro de 1937, que implantou o Estado Novo, o governo divulgou o Plano Cohen, uma artimanha que descrevia a estratégia dos comunistas para chegar ao poder.  Era uma justificativa para violação da democracia e introdução do regime autoritário. Anos depois, revelou-se tratar-se de simulação idealizada pelo capitão Mourão Filho, o mesmo que depois general, desceria com as tropas de Minas para depor João Goulart, a pretexto de combater a subversão comunista e a corrupção.

O deposto Goulart era discípulo de Getúlio Vargas, sobre quem pesavam suspeitas de continuísmo. Afinal, o mestre ficara no poder, após o golpe de 1930, por quinze anos, até 1945, descontado o pequeno interregno da Constituição de 1934, em clima de sucessivas decretações de estado de sítio, suspendendo as garantias constitucionais.

Sabe-se, a própria Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, não passou de golpe militar contra o Imperador Pedro II, bastante popular pela abolição da escravatura por sua filha princesa Isabel, em 13 de maio do ano anterior.

O regime republicano não encontrou a devida paz política. Enfrentou sublevações militares em 1922, 1924; a campanha da Coluna Prestes, até chegar a 1930, com a deposição do presidente l Washington Luís, após a vitória do seu candidato Júlio Prestes e a consequente derrota do oposicionista Getúlio Vargas, sob a liderança do coronel Gois Monteiro, elemento de ligação com os tenentes, a jovem oficialidade.

Sob a égide da Constituição de 1946, na crise política de agosto de 1954, o Manifesto dos Coronéis, foi determinante para o suicídio de Getúlio Vargas no dia 24, que vendo iminente a deposição, optou pelo gesto supremo de tirar a vida. No ano seguinte, realizadas as eleições presidenciais, eleito Juscelino Kubitscheck, a sua posse foi garantida pelo golpe militar desfechado pelo general Teixeira Lott, em 11 de novembro de 1955.

Durante o governo, Juscelino, logo no início, enfrentou as sublevações militares de Aragarças e Jacareacanga, a pretexto da ilegitimidade de sua posse, garantida pelo golpe militar do general Lott. Eram ensaios para o que viria a ocorrer em 31 de março de 1964, redundando em 20 anos de ditadura.

Quase 30 anos após a promulgação da Constituição de 1988, volta-se a falar, desde o impeachment da presidenta Dilma, em golpe. Repete-se o bordão em relação ao ano quem vem: Lembrai-vos de 1937. Os golpistas agora estão no Legislativo e no Judiciário, e não nas Forças Armadas.