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Notícia

Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

A judicialização da política – legitimidade democrática

Publicado por Sandra Mafra em JusBrasil

O Supremo tribunal Federal tem fortemente defendido os Direitos Fundamentais e as Garantias Constitucionais aproximando-se de pontos defendidos pelas teorias garantista de Luigi Ferrajoli, com o escopo de resolver conflitos sociais e temas de interesse difusos e coletivos e de uma sociedade repleta de novas formas de proteção como meio ambiente, direitos trabalhistas e do consumidor, percebendo-se uma nova atribuição do papel jurisdicional com o adensamento da normatização, intercorrentes de modelos estatais que entrevêem protagonizando políticas de bem estar social.

Num quadro tão explícito, os efeitos de uma Constituição garantista como a nossa, só poderia resultar em demandas com o intuito de resolver os conflitos de uma sociedade peculiar, cheia de novas situações, carente de atuação jurídica protetiva, estando o direito mais atuante, surgindo assim, o que vem sendo denominada “judicialização da Política”.

Esse fenômeno confere maior exercício do Poder Judiciário, deve estar vinculado à demanda social como protagonista, ou essa consequência instrumentalizada pela teoria processual, denota um ativismo judicial na dinâmica social.

Alguns cientistas políticos enumeram condições para o surgimento da Judicialização da Política quais são:

a) a existência de um sistema político democrático

A história tem nos mostrado que é impossível um processo de expansão do poder judicial em um país autoritário, somente após a CF/88 é que pode ser considerado o veto Constitucional do Judiciário.

b) a separação de poderes

Este é um princípio Constitucional que estabelece competências exclusivas aos três poderes, mas que pouco valeu antes da Constituição de 1988. O exercício dos direitos políticos; mesmo estabelecidos de maneira formal não é garantia de seu cumprimento, mas pode-se perceber um nível de obediência à lei desde a CF/88, inclusive aos direitos individuais.

c) o uso das cortes pelos grupos de interesses

Passando a considerar ou utilizando a possibilidade de veto dos tribunais na realização dos seus objetivos, tendo uma boa parcela de participação nas ações judiciais.

d) o uso dos tribunais pela oposição

Utilizam com freqüência os tribunais para inviabilizar as alterações em curso.

e) a inefetividade das instituições majoritárias

Toda demanda social que não envolva interesse suficiente ou agregue alto custo certamente encontrará dificuldade para ser efetivada.

A grande maioria dos países democráticos do mundo se organiza em separação de poderes, essas funções estatais se organizam distintamente, especializados e independentes, contudo, Legislativo, Executivo e Judiciário controlam-se reciprocamente, evitando instâncias hegemônicas, afastando risco para a democracia, eles desempenham o mesmo papel de interpretação da Constituição, respeitar valores e fins nela previstos, no caso de divergência de interpretação das normas Constitucionais ou legais a palavra final é do judiciário, não significa, portanto, que toda e qualquer matéria seja decidida em um tribunal.

Valendo-se desse poder o Judiciário deixou de ser um departamento especializado e se transformou num poder político, confrontando-se com os outros Poderes para fazer valer as Leis e a Constituição. 

Dentro desse contexto o passo seguinte foi a judicialização decorrente do modelo adotado e não de uma vontade política, ao judiciário coube-lhe decidir, porque era o que deveria fazer, sem alternativa, pela falha, omissão, insuficiência ou impotência dos Poderes Legislativos e Executivos, uma condição de aproximação entre Direito e Política (Marco Faro de Castro).  

Em situações de reserva do Poder legislativo, onde há um afastamento entre sociedade civil e classe política impedindo o atendimento efetivo das demandas sociais, a atitude para uma interpretação Constitucional proativa chama-se Ativismo Judicial, expandindo o sentido e alcance.

Advém daí um grande risco para a legitimidade democrática, em que os membros do poder Judiciário não são eleitos pela vontade popular, desempenhando um poder político invalida atos dos outros dois Poderes.

Em um Estado Democrático de Direito onde a democracia significa soberania popular, o governo do povo é sufragado, ou melhor, sufocado por um órgão como Supremo Tribunal Federal que não tem legitimidade popular sobrepõem-se a uma decisão até mesmo do Presidente da República, sem contar dos 513 Deputados e dos 81 Senadores escolhidos pelo voto – é identificado como dificuldade contramajoritária, em que a vontade da maioria identificada através do voto é suplantada pela vontade da minoria.

Nos, o povo brasileiro vive hoje um momento de expansão do judiciário, a democracia não é apenas a garantia do governo da maioria, não é apenas o princípio majoritário, a democracia é também o respeito aos Direitos Fundamentais, inclusive os das minorias, e a preservação das regras do jogo democrático

Portanto, no debate acerca da legitimidade democrática da atuação do Poder Judiciário é preciso ter em conta que o Judiciário deve ter a auto contenção para respeitar o processo político majoritário, mas devem ter a ousadia de assegurar os Direitos Fundamentais, mesmo contra a vontade abusiva das minorias.

Sandra Maria Mafra
Bacharel em Direito Especialista em Direito Constitucional.