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Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

64: Golpe, Contragolpe ou Revolução?

O ex-presidente da União Nacional dos Estudantes-UNE Aldo Arantes, lançou ano passado o livro de memórias “Alma em Fogo”, relatando os episódios por ele protagonizados por mais de meia centúria na vida pública nacional. Para breve, prometem igual relato, o também ex-presidente da UNE, José Serra; e Almino Afonso, Ministro do Trabalho do governo João Goulart-Jango, deposto pelo movimento de 31 de março de 1964, completando em 2014 cinquenta anos.
Boa oportunidade para meditar sobre a história pátria, no ano em que se travarão as eleições gerais, incluindo o pleito presidencial. Nele, concorrerão a ex-guerilheira Dilma Rousseff, combatente contra a ditadura instalada em 1964. O neto de Tancredo Neves, Aécio, personagem importante daqueles acontecimentos, por haver negociado a posse de João Goulart em 1961, mediante o Ato Adicional implantando o Parlamentarismo. Vinte anos depois, em 1985, exercitou as mesmas qualidades de negociador pondo fim ao arbítrio, elegeu-se indiretamente Presidente da República pelo Colégio Eleitoral. Outro concorrente, Eduardo Campos, é neto do ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes, personalidade de relevo naquele período. Temido pela direita e pelos militares, por Jango e pelos setores de esquerda, por desenvolver os seus projetos de forma independente.

Como se vê, na política, o passado está presente. A conjuntura internacional e o Brasil de cinquenta anos atrás eram bem diferentes. A Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética dominava o cenário da política mundial. A disputa travava-se nos planos econômico, militar e da propaganda ideológica. A hegemonia norte-americana incontestável neste hemisfério viu-se ameaçada pela opção de Cuba pelo modelo soviético.
O Brasil era uma pedra importante no xadrez da disputa. Os americanos temiam que se transformasse em uma nova China, para tanto através de embaixadas e agentes divulgavam o risco do “perigo comunista” estabeleciam parcerias com militares, empresários, parlamentares, criando institutos nacionais como o IPES, liderado pelo general reformado Golbery Couto e Silva, encarregado de deter os avanços das esquerdas no front interno.
Nas eleições parlamentares de 1962, o IBAD um órgão articulado com o IPES financiou a eleição de deputados e senadores, formando a bancada anticomunista encarregada de impedir a realização das reformas de base- dentre elas a reforma agrária- consideradas bandeiras socializantes, ao lado de outras medidas ligadas a limitação de lucros de empresas estrangeiras e encampação de concessionárias de serviços públicos.
Vistas de longe, as reformas de base não passavam de tentativas de modernização do retardatário capitalismo brasileiro, juntamente reivindicações sindicais e aspirações de relativa independência na condução da política externa, iniciada no curto governo de Jânio Quadros. Mas elas forneciam o pretexto para os adversários de Jango e os aspirantes a sucedê-lo. Destacando-se Carlos Lacerda, este ano completando centenário de nascimento. Um personagem que merece estudo à parte. Na disputa pela oposição, também Magalhães Pinto e Ademar de Barros.
Do seu lado, ambicionavam o trono: o cunhado Leonel Brizola; o ex-presidente Juscelino Kubitschek; o governador de Pernambuco Miguel Arraes. Eram muitos e poderosos os aspirantes, as ambições radicalizavam o jogo da sucessão. Jango tentava manter o equilíbrio e levar o Congresso conservador e manipulado pelo IBAD a votar as reformas de base. Não há qualquer comprovação de que ele conspirasse para prorrogar o mandato, ou seja, dar o golpe. Confiado em seu dispositivo militar, chefiado pelo general Assis Brasil tolerou a revolta dos marinheiros, promovida pelo Cabo Anselmo – hoje se sabe um agente da CIA – incitador da insurreição dos marujos. Era senha para caracterizar a quebra da hierarquia militar e permitir aos conspiradores (os mesmos que vetaram a sua posse em 1961, e que nunca deixaram de conspirar) convencerem a burocracia militar a optar definitivamente pelo golpe, nela, evidenciando-se o general Castelo Branco. Depois, passou a chamar-se de Revolução através do Ato Institucional, da lavra do jurista Francisco Campos.
Derrubado Jango, o consenso dos militares, dos governadores Ademar de Barros, Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, respaldado por Juscelino Kubitschek, recaiu sobre o general Castelo Branco, com o compromisso de realizar as eleições presidenciais do ano seguinte.
As eleições de 65 não se realizaram, Castelo prorrogou o mandato e passou o governo para o seu ministro da Guerra em 1967. O golpe de 64 durou vinte anos. O que ele tem a ver com as eleições deste ano? Ainda veremos, quer o chamemos de golpe, contragolpe ou revolução. Voltaremos ao tema.
 

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