DE BRASÍLIA
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, acha que o eleitor brasileiro vai “cobrar caro” do Congresso se uma reforma política não for realizada com participação popular por meio de um plebiscito. Diz também que a articulação política do governo com o Congresso “precisa” de mudanças.
Em entrevista à Folha e ao UOL, o petista que hoje é o articulador mais próximo da presidente Dilma Rousseff, faz uma previsão de “renovação forte” no Poder Legislativo na eleição de 2014 no caso de o Congresso se recusar a melhorar o sistema político.
Mercadante vocaliza em público o que em Brasília tem sido comum ouvir nos bastidores: o Palácio do Planalto está jogando para o Congresso a responsabilidade pela falência em certos aspectos do modelo de representação política no país. Dilma Rousseff quer construir uma narrativa na qual ela fez propostas para atender aos protestos das ruas, mas o Poder Legislativo não teve a mesma sensibilidade.
Eleitor vai cobrar caro do Congresso, diz Mercadante
Ao falar sobre a atuação do governo no Congresso, Mercadante recomenda: “A articulação política do governo precisa ter muito mais a participação dos ministros. Os ministros precisam ter mais presença no Congresso”.
Sobre a liberação de emendas ao Orçamento feitas por deputados e por senadores, diz que “atrasou mesmo” e “é um erro político” da administração federal. “Tem que respeitar o mandato parlamentar”.
Ao analisar as quedas de popularidade e de intenção de voto de Dilma Rousseff nas pesquisas, Mercadante fala de maneira otimista: “Ela não só vai se recuperar como nós vamos vencer a eleição”. E mais: “Temos chances de vencer no primeiro turno”.
Cotado para assumir a Casa Civil numa reforma ministerial e já escalado como um dos coordenadores da campanha da reeleição da presidente petista, Mercadante afirma que o projeto de poder do PT conta com o trabalho do marqueteiro João Santana, “um grande estrategista”.
Por que houve a queda de popularidade da presidente? Para o ministro da Educação, as manifestações de rua em junho provocaram um “problema político-psicológico circunstancial”, que não terá “impacto duradouro”.
A seguir, trechos da entrevista:
Folha/UOL – A Câmara enterrou a proposta de plebiscito para uma reforma política válida em 2014. O governo teria de ter articulado melhor para evitar esse revés?
Aloizio Mercadante – Primeiro, vamos ver politicamente quem vai sofrer revés.
Quem vai?
Eu acho que é o Congresso. O Congresso precisa ouvir a rua.
O Congresso será visto como vilão da história?
Não o vilão. E nem é a intenção nossa…
Mas não parece…
Lutei muitos anos dentro do Congresso por reforma política. Financiamento de campanha não pode continuar como está. É um dos problemas mais sérios da democracia brasileira.
E se o Congresso não quiser?
Há um problema de prazo mesmo. É verdade. Mas podíamos fazer a reforma política. Não dá para fazer a reforma toda? Vamos fazer alguma reforma para 2014. Mas os pontos fundamentais não serão alterados sem a participação popular.
E se o Congresso se recusar? Erra?
Eu acho que o voto vai cobrar caro…
Como assim?
Vai cobrar caro. Acho que vai ter uma renovação forte no Congresso se o Congresso não ouvir esse sentimento que está na rua. O tempo vai dizer.
Por que a presidente foi vaiada na marcha dos prefeitos?
No final. As pessoas [prefeitos gritavam]: “Queremos fundo. Fundo de Participação dos Municípios. Aí ela falou: “Não tem mágica. Nós temos, eu e vocês, temos restrição. Eu estou fazendo tudo o que eu posso dentro da responsabilidade fiscal que o governo vai ter”.
Seria bom reduzir o número de ministérios?
Simbolicamente pode ter alguma importância. Mas do ponto de vista fiscal não tem nenhuma importância.
Simbolicamente seria positivo?
Não há nenhum impacto fiscal importante nessa medida. Se você pegar o serviço de um e colocar dentro do outro. O que nós precisamos discutir é coisa mais substantiva.
A articulação política precisa de alguma mudança?
Precisa.
De qual tipo?
A articulação política do governo precisa ter muito mais a participação dos ministros. Os ministros precisam ter mais presença no Congresso. Dialogar mais com os parlamentares. Receber os parlamentares. Atenderem demanda de parlamentares.
Por que eles não recebem?
Não sei se não recebem. Eu, para votar os royalties [do petróleo], fiz reuniões com todos os líderes [no Congresso]. Os líderes elogiaram. Falaram: “Se os ministros fizessem isso ajudaria muito. Vir aqui discutir a proposta e defender suas ideias, convencer a gente ou não. Ajuda muito na relação com o Parlamento”.
Eu acho que os ministros precisam ter mais aproximação, mais proximidade com os parlamentares.
Por que o governo não libera emendas dos congressistas?
Está liberando agora. Já está encaminhando a liberação das emendas. Atrasou o Orçamento este ano e atrasou a liberação das emendas. Mas tem que liberar. Eu sou totalmente favorável à emenda desde que sejam em programas prioritários.
Mas atrasou…
Isso foi um problema. Atrasou mesmo. E é um erro político. Tem que respeitar o mandato parlamentar. Mas os ministérios estão trabalhando fortemente para poder atender essa expectativa dos parlamentares, que é legítima.
O governo tomou medidas para reaquecer a economia. O crescimento não foi o esperado. Poderia feito mais?
Você viu o relatório do FMI? Já é o quinto rebaixamento de previsão de crescimento no mundo neste ano. É uma conjuntura internacional muito complexa. O Brasil vem preservando o que é essencial, o emprego. Somos o país que mais gerou empregos nos últimos cinco anos de crise, que melhor teve desempenho de taxa de desemprego na economia mundial.
A presidente Dilma Rousseff sofreu uma forte queda na sua popularidade, assim como outros governantes pelo país afora. O marqueteiro João Santana, que fez a campanha de 2010, deu uma declaração dizendo que em quatro meses ela recupera essa popularidade, tudo volta ao normal e ela ainda ganha a reeleição no 1º turno no ano que vem. O sr. concorda?
O João Santana conhece muito de eleição. É um grande especialista nessa área. Tem tido uma carreira brilhante. Elegeu vários presidentes da República no Brasil e fora do Brasil. Eu não sei dizer o prazo. E eleição tem muito chão. Mas eu estou muito confiante na recuperação e muito confiante na nossa vitória eleitoral.
Mas é exequível esse cronograma, de quatro meses…?
Meu sentimento é o seguinte: a vida das pessoas não se alterou por causa das mobilizações. As mobilizações têm um impacto psicológico na hora. Gerou uma insegurança, principalmente aquele negócio de quebrar coisas, vandalismo. Aquilo gerou uma insegurança coletiva. Tanto é que a sociedade falou: olha, isso aí não dá desse jeito, não quero isso.
O governo foi muito firme. Por exemplo, naquela mobilização dos caminhoneiros, a presidente [Dilma] falou: “Isso aqui não tem negociação. É inaceitável bloquear estradas. A Polícia Federal vai entrar, vai processar, vai identificar e vai responsabilizar”.
Todos os políticos tiveram uma queda. Acho que é um problema político-psicológico circunstancial. Não é um episódio que tenha impacto duradouro. A presidenta, não há nada no governo dela que tenha se alterado nesse período. Nós já fizemos muito e estamos fazendo mais.
No seu partido muita gente diz que se ela continuar caindo há a hipótese de Lula voltar…
Não discuto essa hipótese porque eu acho que ela não só vai se recuperar como nós vamos vencer as eleições. A oposição não conseguiu crescer nessas eleições. Nesse processo. Não conseguiu eleitoralmente. Nenhuma liderança da oposição conseguiu se firmar.
Ao contrário, quem respondeu, quem dialogou, quem teve iniciativa, quem recebeu os manifestantes, as centrais sindicais, movimentos sociais, a juventude, movimento do campo, povos indígenas, a LGBT, foi a presidenta Dilma.
Ela dialogou, teve iniciativa, teve pauta, e vai entregar, está entregando a agenda do Congresso, como a questão do combate à corrupção, Ficha Limpa, está entregando, teve redução na tarifa, aumentou o subsídio do transporte para melhorar, está lançando o programa de mobilidade, está lançando um programa de investimentos, R$ 50 bilhões de mobilidade, que vai ser um programa novo de grande impacto, fez um programa fortíssimo na saúde, quebrando tabus, abrindo um grande debate para melhorar a oferta de médicos no país, a infraestrutura da medicina, aprovando os royalties do petróleo.
A agenda que ela propôs do pacto nós estamos implantando. Essa energia da rua trouxe avanços para o Brasil que ela soube dialogar e incorporar e encaminhar. Por isso ela sairá fortalecida desse processo, como liderança, com estabilidade do país, com coragem politica, com disposição de negociação.
Como [Manuel] Castells diz, no mundo, nenhum presidente agiu como ela. E isso talvez até faça a diferença para o futuro, diante de mobilizações como essa.
O sr. teme uma candidatura do Joaquim Barbosa?
Absolutamente democrático, que todos sejam candidatos, que acharem que têm condições, e disputem a eleição.
O que eu tenho convicção é que nós temos 10 anos de história nesse país de estabilidade econômica, de avanço da democracia, a maior distribuição de renda da história do Brasil, os maiores avanços sociais da história do Brasil, e estamos vivendo grandes avanços da democracia do Brasil. E isso tudo tem nome. Sabe como chama? Dilma.
O sr. falou que a presidente vai se recuperar e se reeleger…
É a minha convicção profunda. É o melhor projeto para o Brasil.
Ela tem condições de se reeleger no primeiro turno e reunir uma aliança, como em 2010, com dez partidos na coligação? Pode repetir esse número ou até ampliar?
Eu acho que temos. Em todas as conversas com todos os partidos, temos algumas dificuldades no Parlamento. Mas fomos muito bem em termos de aliança para 2014. Todo mundo vê na presidente Dilma um grande projeto de continuidade das mudanças no Brasil e uma grande perspectiva eleitoral. E não só as pesquisas, porque o Datafolha não publicou o segundo turno…
Não fez pesquisa de segundo turno.
Mas daria Dilma disparado. Na minha opinião, não há ainda nenhuma candidatura… Hoje, por exemplo, se você pegar na última eleição de 2010, o candidato da oposição, na época José Serra, neste período ele tinha 35% da intenção de voto. Não tem nada próximo a isso na oposição. Há uma dispersão. Nenhuma candidatura conseguiu ampliar em termos de aliança, não estão conseguindo ampliar em termos de aliança, não estão conseguindo construir palanques estaduais fortes e não conseguiram crescer apresentando alternativas ao Brasil. Quais foram as ideias que foram debatidas no Brasil nesta crise? Me diga uma ideia da oposição. Eu vi uma hoje: acabar com a reeleição, que não fomos nós que construímos. E o povo votou a favor da reeleição, Fernando Henrique se reelegeu, Lula se reelegeu, vários governadores se reelegeram. Não vi uma intervenção. Não que a oposição não tenha ideia, [digo] projetos marcantes, ideias generosas, ousadas, alternativa da política econômica, alternativa de políticas sociais, uma alternativa para as reformas políticas do país.
A agenda do país é a agenda da presidente Dilma, uma agenda ousada, corajosa, que está permitindo o Brasil manter o emprego, crescer, distribuir renda, manter a democracia, realizar as metas de redução. E é por isso que o país é essa referência internacional.
O sr. diz então que a situação eleitoral é mais confortável do que 2010?
Seguramente é mais confortável. A presidente Dilma, em 2009, não existia nas pesquisas. Era o que vocês diziam, traço: não tinha chance nenhuma, não tinha vocação para política. Leiam tudo o que foi escrito no período: não tinha a menor chance de se eleger, era uma aventura. E ganhou.
Hoje, ela tem história, realizações desses dez anos para mostrar. Na hora que começa a campanha, ganha quem tem café no bule, quem tem argumento, que tem o que mostrar o que fez para o país. Na narrativa deste período também vai ficar registrado que quem teve iniciativa, apresentou uma agenda, quem apresentou avanços para o país é a presidente Dilma. Foi ela que dirigiu o país com segurança, firmeza e espírito democrático.
Ela tem condições de vencer no primeiro turno e com dez partidos?
Tem. Eu acho que tem. Seguramente a aliança vai estar em torno disso. Vai ser mais forte do que foi na última eleição. A aliança nacional, hoje, vejo com mais chance de se ampliar em torno mais da qualidade do que do número de partidos. Mas os principais partidos do país, que são da base de sustentação do governo, estarão com a presidente. Nos Estados vamos ter de ter mais de um palanque.
E a presidente poderá vencer no primeiro ou segundo turno?
Temos chances de vencer no primeiro turno. Apesar de que, em todas as eleições presidenciais nossas, nós vencemos no segundo turno. Temos de nos preparar para o segundo e trabalhar para ganhar no primeiro. E o João Santana é um grande estrategista.
O governador Eduardo Campos, do PSB, da base de apoio da presidente Dilma, sinaliza que pode deixar a aliança e ser candidato. Essa é uma baixa certa?
Não. Ele não definiu ainda que será candidato. É uma liderança nova, que tem futuro político. É absolutamente legítimo se ele quiser ser candidato. Nós estamos preparados para a disputa eleitoral. Se você olhar as grandes realizações do governo dele, tem muito a ver com o presidente Lula e com a presidente Dilma. O porto de Suape, a ferrovia Transnordestina, a duplicação da rodovia, o polo petroquímico, a fábrica de hemoderivados, a ida da fábrica da Fiat e o polo automotivo. Todas essas grandes realizações do governo [de Pernambuco] são projetos estruturantes do governo federal. Essa aliança com o governo federal foi muito importante.
Já em 89, eu me lembro que eu ia com o presidente Lula fazer aliança com o Miguel Arraes [1916-2005; avô de Eduardo Campos]. Quando ele tomou posse em 1963, como governador [de Pernambuco], ele fala assim: “É muito importante manter a unidade e a aliança do campo popular. Porque a nossa divisão sempre levou a um retrocesso político e atraso na história do Brasil”.
Então o sr. acha que Eduardo Campos deveria ficar na aliança da presidente Dilma?
Evidente que ele sempre será sempre muito bem recebido no campo de alianças. Mas se ele quiser sair candidato, vamos respeitar e é um direito legítimo e democrático. Será sempre bem recebido o PSB na nossa aliança.
Quem é o principal adversário da presidente Dilma?
Olhando para as últimas eleições, o partido mais estruturado no país é o PSDB. Tem mais governadores, tem mais base social, tem base econômica. A dificuldade deles é comparar os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso com os dez anos de Lula e Dilma. Essa é a grande dificuldade eleitoral. Eles perderam base social e política no país. Mas ainda é o partido com maior inserção e maior capacidade de aliança e maior potencial eleitoral.
O sr. enxerga a possibilidade de uma terceira via, fora da disputa entre PT e PSDB?
Hoje eu não vejo ainda nenhuma candidatura fora dessa alternância de poder com chances reais de construir uma aliança e se viabilizar eleitoralmente. Agora, eleição é uma eleição.
Vamos esperar. Hoje eu diria que o projeto hegemônico na sociedade, majoritário na aliança política, que vai ter os melhores palanques estaduais, que tem mais história para mostrar, indicadores e realizações, é o governo da presidente Dilma. Quem vai ser o adversário? Se me perguntar hoje, a candidatura mais estruturada ainda é a do PSDB.
E a hipótese do volta-Lula?
O presidente Lula pode ser candidato a qualquer coisa depois de tudo que ele fez pelo país. Mas ele tem um profundo carinho, respeito e compromisso com o governo da presidente Dilma.
E o candidato de Dilma é Lula. Todas as tentativas de separar os dois fracassarão.
O candidato de Dilma é Lula? Tem um erro aí? Foi o que o sr. falou.
E o candidato de Lula é Dilma [risos]. E vice-versa. E nessa eleição o candidato de Lula é Dilma. Ali é uma coisa só. O povo vê os dois como uma coisa só. É uma instituição só. Se ter um presidente só era muito bom, agora ter dois é melhor ainda. Essa é a leitura do povo brasileiro.
Significa então que, se não der para ir de Dilma, vocês vão de Lula?
Não. Nós temos uma candidata que é Dilma, mas temos o presidente Lula que é uma âncora, uma referência popular, um cabo eleitoral extraordinário, articulador político, comunicador social, tem uma história belíssima. Que é outra grande alavanca para candidatura da presidente Dilma. E é isso que vai acontecer. A candidata é Dilma e terá o apoio incondicional do presidente Lula, como tem tido em todo seu governo.