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Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

Súmula vinculante nº 13 e os agentes políticos – a grande omissão do Supremo Tribunal Federal

Publicado por Marcio Gai Veiga em JusNavigandi

Resumo: Dentre as várias formas de provimento de cargos públicos no Brasil, está a nomeação para os cargos classificados como “agentes políticos” que, em alguns casos, podem ser nomeados sem concurso público, desde que essa nomeação não viole os princípios constitucionais administrativos. Vigem no Brasil as súmulas vinculantes, que, com suporte constitucional, vinculam a administração pública em geral e visam a alcançar aos jurisdicionados a segurança jurídica sobre posições pacíficas do STF. Há em nosso País a tradição de um parente, ocupante de cargo político eletivo, nomear outro parente para a assunção de cargo político não eletivo, ato administrativo esse que viola os princípios da administração pública e caracteriza o nepotismo. A súmula Vinculante n. 13 do Supremo Tribunal Federal veda o nepotismo na administração pública brasileira. Os tribunais pátrios, firmados em um suposto entendimento do Supremo, têm julgado que a Súmula Vinculante n. 13 não se aplicaria aos agentes políticos, linha essa que, se bem vista, não representa a posição da Corte Maior Brasileira. O Supremo Tribunal Federal omitiu-se, e vem se omitindo, a respeito da inclusão expressa dos agentes políticos no texto da súmula vinculante, lacuna casual (ou seria casuística?) que tem causado enorme insegurança jurídica e tem avalizado atos de improbidade por todo o país.

Palavras-chave: Súmula Vinculante n. 13; Agentes Políticos; Nepotismo; omissão; Supremo Tribunal Federal

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é um exame contemporâneo sobre a Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal, voltado à análise sobre aplicação deste enunciado aos chamados agentes políticos.

Os estudos que originaram o presente artigo foram realizados no segundo semestre do ano de 2013, de modo que o arrazoado retrata a realidade do tema nessa época e, por consequência, tem suporte nas decisões dos Tribunais sobre a matéria publicados até o final desse ano1.

Por todo o Brasil têm se disseminado decisões que tomam a Súmula Vinculante nº 13 com não aplicável aos agentes políticos, sob o argumento de que o Supremo Tribunal Federal assim tem entendido. Desse modo, o intuito do presente estudo é analisar se de fato esse é o entendimento da Corte Maior sobre a matéria e, em um segundo momento, tecer uma análise crítica sobre o tema.

Não se trata de uma análise profunda doutrinária sobre os temas pertinentes. O foco principal, como dito, é a observância contextual das principais decisões que dão suporte aos julgamentos sobre a não aplicação da Súmula e a realização de uma análise crítica sobre o assunto.

O estudo está dividido em seis capítulos, tratando o primeiro sobre a forma de provimento dos servidores públicos (lato sensu); o segundo das súmulas vinculantes; o terceiro da Súmula Vinculante nº 13 e decisões concernentes; o quarto do nepotismo e da violação aos princípios da administração pública; o quinto da Súmula Vinculante nº 13 e os agentes políticos na visão do Supremo Tribunal Federal e o sexto da Súmula Vinculante nº 13 – uma análise crítica.

Essas são as ponderações iniciais.

1 DOS SERVIDORES PÚBLICOS (LATO SENSU) E DAS FORMAS DE PROVIMENTOS

Os servidores públicos (lato sensu) são tratados pela Constituição Federal no Título III, Capítulo VII, este que trata da Administração Pública, com redação dada pela Emenda Constitucional 19/98.

Nesse Capítulo, o art. 37, após fixar em seu caput os princípios basilares da Administração Pública2, disciplina em seu inciso I que “os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei”. Logo em seguida, no inciso II, consta que:

a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Essa distinção inicial já permite a diferenciação entre cargo, emprego e função pública, de modo que somente os dois primeiros é que são providos por meio de concurso público3.

Adiante, ainda no mesmo art. 37, a Constituição estabelece como são providas as funções públicas, dividindo-as em funções de confiança e os cargos em comissão ou de contratação por tempo determinado:

V – as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento. (…) IX – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

Ainda nesse dispositivo, ao tratar da remuneração e do subsídio, em uma redação ali inserida pela Emenda 41/03, há na Constituição Federal a menção a uma outra categoria, a dos agentes políticos:

XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como li-mite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o sub-sídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tri-bunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos. (grifou-se)

Então, em uma interpretação lógica do texto constitucional, afora outras categorias de menos importância para o presente trabalho4, temos os cargos e empregos públicos, as funções de confiança e em comissão, os servidores temporários e os agentes políticos.

Nessa classificação, no que ora interessa, Celso Antônio Bandeira de Mello traz uma respeitada concepção agentes políticos:

Agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do país, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes do Executivo, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados Federais e estaduais e os vereadores.5

Ainda sobre o quem são os agentes políticos, a doutrina de Maria Sylvia Zanella Di Pietro é esclarecedora:

São, portanto, agentes políticos, no direito brasileiro, por que exercem típicas atividades de governo e exercem mandato, para o qual são eleitos, apenas os Chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e municipal, os Ministros e Secretários de Estado, além de Senadores, Deputados e Vereadores. A forma de investidura é a eleição, salvo para os Ministros e Secretários, que são de livre escolha do Chefe do Executivo e providos em cargos públicos, mediante nomeação.6

Dessa forma, quanto a forma de provimento, em suma: os cargos e empregos públicos são ocupados mediante concurso público; as funções públicas podem ser preenchidas sem concurso público no caso de função em comissão; e os agentes políticos podem alcançar o cargo por meio de eleição ou, em alguns casos, por livre nomeação do eleito.

2 SÚMULAS VINCULANTES

O Título IV da Constituição Federal trata “da organização dos poderes” no Brasil. No Capítulo III desse Título, onde é regulado o “Poder Judiciário”, na sua Seção II, que estrutura o STF, foi acrescido no ano de 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45, o artigo 103-A, que criou em nosso país a chamada Súmula do STF com efeito vinculante.

Uma vez criadas, as súmulas vinculantes ficaram adormecidas desde a sua criação, em 2004, até o ano de 2006, quando o instituto foi regulado pela Lei Federal Ordinária nº 11.417, de 20 de dezembro daquele ano. Essa Lei, em onze artigos, regulamentou a matéria, fixou os limites da edição das súmulas vinculantes e reafirmou a abrangência traçada pela Constituição Federal.

Após essa regulamentação ter passado a viger, a questão ainda ficou fora de cena por mais alguns meses, até que na sessão plenária do Supremo Tribunal Federal realizada em 30 de maio de 2007 foram editadas as primeiras três súmulas vinculantes.

A Súmula Vinculante nº 13, objeto de estudo do presente trabalho, foi proposta na sessão de 20 de agosto de 2008 e aprovada no dia seguinte, na sessão plenária que ocorreu em 21 de agosto de 2008.

Nesses termos7, havendo a regular tramitação, as súmulas vinculantes, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terão efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como podem ser revistas ou canceladas, na forma prevista nessa Lei.

Considerando esse pilar constitucional e legislativo, essa vinculação que passa a existir com a publicação da súmula vinculante somente desaparece na hipótese de haver a revisão ou cancelamento de seu enunciado.

Outra observação necessária é no sentido de que o art. 103-A da Constituição dispõe que essas súmulas, após seu regular trâmite, tem efeito vinculante “em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”, cabendo ao Supremo “proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”.

A interpretação desse ponto do caput leva nitidamente a não vinculação do próprio STF. Essa desvinculação, parece certo, está vinculada ao fato de que como esse Tribunal Superior, por decisão tomada por 2/3 (dois terços) dos seus membros, tem o poder de editar, revisar e cancelar o enunciado das súmulas vinculantes, em virtude de que não estaria vinculado ao texto em vigor.

Nada obstante a isso, em um raciocínio lógico, o STF não está autorizado a descumprir pura e simplesmente as suas súmulas vinculantes. Como compete a esse Tribunal editar, revisar e cancelar essas súmula, caso haja alguma desconformidade no texto com o entendimento predominante na Corte deveria, em tese, haver a revisão com o quorum necessário.

3 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 E DECISÕES CONCERNENTES

Antes da edição da Súmula Vinculante em estudo, o nepotismo foi tratado em várias oportunidades pelo Supremo Tribunal Federal.

Dentre as decisões que antecederam a Súmula Vinculante nº 13, está o Mandado de Segurança – MS nº 23.780-5, impetrado por Terezinha de Jesus Cunha Belfort contra o Plenário do Tribunal de Contas da União – TCU e o Juiz Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região. Por meio dessa ação constitucional, a autora visava a anular ato que a exonerou de cargo em comissão e, consequentemente, objetivava a sua reintegração.

A impetrante, servidora pública da Secretaria Estadual da Educação do Estado do Maranhão, havia sido colocada a disposição do Tribunal de Regional do Trabalho – TRF da 16ª Região em 1989 e, desde então, vinha exercendo cargos de confiança naquele TRF. A última nomeação da aludida servidora ocorreu em 13.10.1994, e o ato que a nomeou foi tido como ilegal pelo TCU, já que Terezinha é irmã do então vice-presidente do aludido Tribunal, Fernando José Cunha Belfort.

O MS teve como relator o Ministro Joaquim Barbosa e culminou na seguinte ementa, publicada em 3.3.2006:

MANDADO DE SEGURANÇA. NEPOTISMO. CARGO EM COMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. Servidora pública da Secretaria de Educação nomeada para o cargo em comissão do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região à época em que o vice-presidente do Tribunal era parente seu. Impossibilidade. A proibição do preenchimento de cargos em comissão por cônjuges e parentes de servidores públicos é medida que homenageia e concretiza o princípio da moralidade administrativa, o qual deve nortear toda a Administração Pública, em qualquer esfera de poder. Mandado de Segurança denegado. (STF – MS 23.780-5 – Maranhão)

O foco das discussões do Supremo nesse caso foi no rumo de que as orientações do Tribunal de Contas da União – TCU que obstavam as nomeações em órgãos da justiça trabalhista para “cargos em comissão, de cônjuges ou parentes consanguíneos ou afins, até o terceiro grau, de juízes em atividade ou aposentados há menos de cinco anos, exceto em se tratando de servidor titular de cargo público de provimento efetivo de juízo ou tribunal” eram legítimas, de modo que o mandamus foi denegado.

Nesses casos específicos, dos TRTs, as leis ordinárias que criaram esses tribunais previam a vedação dessas nomeações. Havia dispositivo legal vendando essa prática. O foco do STF, na oportunidade, foi então o de afastar os argumentos de que o TCU não seria apto a considerar ilegal nomeações de servidores a cargos comissionados e de confiança nos TRFs que caracterizassem nepotismo.

Porém, em outros casos não havia legislação própria vedando a nomeação de parentes. É o caso da nomeação de parentes para funções em comissão e para agentes políticos empossados por livre nomeação (cargos não eletivos).

Em virtude disso, veio a tona a linha de que seria necessária a edição de lei ordinária que tratasse e regulasse esse tema, de modo que, segundo essas teses, somente após a edição de uma lei nesse sentido é que se poderia, eventualmente, considerar ilegal essas nomeações.

Nesse contexto, chegou ao STF Ação Direta de Constitucionalidade – ADC nº 12, que teve como relator o então Ministro Carlos Ayres Britto. Essa causa foi proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil – AMB, em prol da Resolução nº 07/2005, do Conselho Nacional de Justiça. Tal resolução, por sua vez, "disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário e dá outras providências”. O julgamento desta Ação ocorreu na Sessão Plenária de 20.8.20088e foi no sentido de o Supremo, por unanimidade, julgar procedente a ação declaratória de constitucionalidade e, por maioria, emprestar interpretação conforme a Constituição para deduzir a função de chefia do substantivo “direção”, constante dos incisos II, III, IV e V do artigo 2º da Resolução nº 07, de 18/10/2005, do Conselho Nacional de Justiça9.

Na mesma sessão, foi julgado o RE nº 579.951, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte10 o qual, confirmando decisão de primeiro grau proferida em ação civil pública declaratória de nulidade de ato administrativo, entendeu não existir inconstitucionalidade ou ilegalidade na nomeação de Elias Raimundo de Souza e Francisco Souza do Nascimento para o exercício, respectivamente, dos cargos em comissão de secretário municipal da saúde e de motorista, embora fossem há época, respectivamente, o primeiro, irmão de vereador, e, o segundo, do Vice-Prefeito do Município de Água Nova/RN.

Nesse caso, divergindo do primeiro e segundo graus do Rio Grande do Norte, o STF afastou a tese de que seria necessária legislação ordinária que regulasse a matéria, estabelecendo que a vedação de tais nomeações violavam diretamente o caput do art. 37 da Constituição Federal, que é autoaplicável.

O julgamento, que, como dito, ocorreu em 20.8.200811, teve a seguinte ementa:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VEDAÇÃO NEPOTISMO. NECESSIDADE DE LEI FORMAL. INEXIGIBILIDADE. PROIBIÇÃO QUE DECORRE DO ART. 37, CAPUT, DA CF. RE PROVIDO EM PARTE. I – Embora restrita ao âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça, a prática do nepotismo nos demais Poderes é ilícita. II – A vedação do nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática. III – Proibição que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal. IV – Precedentes. V – RE conhecido e parcialmente provido para anular a nomeação do servidor, aparentado com agente político, ocupante, de cargo em comissão. (STF – RE nº 579.951)

Assim, o STF nesse caso espancou a tese de que haveria a necessidade de edição legislativa que vedasse o nepotismo.

Porém, o Supremo, nesse Recurso, decidiu também que seria o caso de afastar tão-somente Francisco Souza do Nascimento do exercício motorista, mantendo no cargo de secretário municipal da saúde a pessoa de Elias Raimundo de Souza.

Tal deslinde teve origem no voto do Ministro Marco Aurélio, que divergindo inicialmente do relator Ricardo Lewandowski, trouxe ao plenário a discussão sobre aplicar-se ou não a vedação do nepotismo aos cargos políticos de livre nomeação.

Em virtude disso, a corte traçou uma distinção entre cargos e funções singelamente administrativas e cargos políticos:

Então, quando o artigo 37 refere-se a cargo em comissão e função de confiança, está tratando de cargos e funções singelamente administrativos, não de cargos políticos. Portanto, os cargos políticos estariam fora do alcance da decisão que tomamos na ADC 12, porque o próprio Capítulo VII é Da Administração Pública enquanto segmento do Poder Executivo. E sabemos que os cargos políticos, como, por exemplo, os de Secretário Municipal, são de agentes de Poder, fazem parte do Poder Executivo. O cargo não é em comissão, no sentido do artigo 37. Somente os cargos e funções singelamente administrativos – é como penso – são alcançados plea imperiosidade do artigo 37, com seus lapidares princípios. Então, essa distinção me parece importante para, no caso, excluir do âmbito da nossa decisão anterior os Secretários Municipais, que correspondem a Secretários de Estado, no âmbito dos Estados, e Ministros de Estados no âmbito federal. (Ministro Carlos Britto, inteiro teor do RE 579.951/RN, pg. 11)

Essa distinção foi consensual na Corte e resultou na exoneração somente do irmão motorista, que ocuparia cargo não político12.

Dessa forma, em uma única sessão, o STF julgou a ADC nº 12 e o RE 579.951/RN, que são dois dos parâmetros para a formulação da Súmula em estudo.

Foi ainda mais além o Supremo. Na mesma sessão plenária ordinária de 20.8.2008, em um momento histórico em que a Súmula Vinculante já existia em nosso País13, o Ministro Ricardo Lewandowski, baseado, dentre outras decisões a respeito14, no Mandado de Segurança – MS nº 23.780-515, na Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC nº 12 e no Recurso Extraordinário – RE nº 579.951, encaminhou proposta inicial de súmula vinculante ao plenário do STF, com o seguinte enunciado:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor do mesmo Órgão investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou ainda de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendendo ajuste mediante designações recíprocas, viola o art. 37, caput, da Constituição Federal.16

Na sessão do dia seguinte, de 21.8.2008, o texto foi discutido e aprovado, nesses moldes:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma Pessoa Jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Como se percebe da comparação entre a proposta e a redação aprovada, o debate entre os ministros cingiu-se a substituição dos termos “mesmo Órgão” e “viola o art. 37, caput, da Constituição Federal”, por, respectivamente, “mesma Pessoa Jurídica” e “viola a Constituição Federal”, além de realizar alguns ajustes quanto a pontuação.

Assim, em dois dias seguidos de trabalho, o STF, na sequência, analisou a ADC nº 12, o RE 579.951/RN e o texto da Súmula Vinculante nº 13.

Tal análise cronológica e contextual leva a uma conclusão inafastável a respeito da redação da Súmula Vinculante em pauta. A não inclusão expressa dos “agentes políticos” no corpo da súmula não passou desapercebida pelo crivo dos ministros.

Partindo desse ponto, cabe se tentar chegar a uma segunda premissa, bem mais difícil. Observar se o fato de não haver a expressão “agentes políticos” no corpo da Súmula significa que: seu texto aplica-se a todos os cargos de provimento sem concurso público, sem qualquer exceção; não se aplica aos agentes políticos de uma maneira geral17 ou se, em uma terceira hipótese, houve uma intencional omissão para que cada caso concreto pudesse ser analisado18.

Essa análise se torna bastante dificultosa porque as discussões que, propriamente ditas, culminaram na aprovação da Súmula Vinculante nº 13 não trataram da inclusão ou não do termo “agente político” no texto da súmula19.

Em face disso, a interpretação do intuito do Supremo em relação à matéria pauta-se basicamente análise das discussões ocorridas no julgamento do RE 579.951/RN e em decisões posteriores à vigência da súmula.

Essa matéria ainda é nebulosa no STF.

Atualmente o Supremo vem interpretando sua própria súmula, ora em um sentido ora em outro.

No julgamento do RE 579.951/RN não houve consenso entre os Ministros sobre se, objetivamente, o nepotismo não se aplica aos cargos políticos ou se, no entender da corte não se aplicaria de plano, mas seria necessária a análise caso de cada caso concreto.

Após, foi julgada pelo STF em 2008 a Reclamação 6.650-9/PR, proposta por Eduardo Requião de Melo e Silva contra decisão do juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, que, nos autos de uma ação popular, suspendeu sua nomeação para o cargo de secretário estadual de transportes.

O fundamento do juízo de primeira instância para o afastamento foi no sentido de que dita nomeação iria de encontro à Súmula Vinculante nº 13, pois Eduardo é irmão do então governador do Paraná, Roberto Requião de Mello e Silva.

O Ministro Cesar Peluso deferiu a liminar pleiteada, determinando a suspensão da decisão impugnada, fazendo menção genérica ao julgamento do RE 579.951/RN, referindo-se que nesse decisum a Corte teria se posicionado no sentido de que a Súmula não se aplica aos agentes políticos de livre nomeação.

Da decisão liminar, foi interposto Agravo Regimental, que teve como relatora a então Ministra Ellen Gracie. O agravo foi improvido, por maioria20, sob o argumento de que a súmula não se aplicaria ao agente político secretário de estado:

AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR EM RECLAMAÇÃO. NOMEAÇÃO DE IRMÃO DE GOVERNADOR DE ESTADO. CARGO DE SECRETÁRIO DE ESTADO. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE Nº 13. INAPLICABILIDADE AO CASO. CARGO DE NATUREZA POLÍTICA. AGENTE POLÍTICO. ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 579.951/RN. OCORRÊNCIA DA FUMAÇA~DO BOM DIREITO. 1. Impossibilidade de submissão do reclamente Secretário Estadual de Transporte, agente político, às hipóteses expressamente elencadas na Súmula Vinculante nº 13, por se tratar de cargo de natureza política. 2. Existência de precedente do Plenário do Tribunal: RE 579.951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 12.9.2008. 3. Ocorrência de fumaça do bom direito. 4. Ausência de sentido em relação às alegações externadas pelo agravante quanto à conduta do prolator da decisão agravada. 5. Existência de equívoco lamentável, ante a impossibilidade lógica de uma decisão devidamente assinada por Ministro desta Casa ter sido enviada, por fac-simile, ao advogado do reclamante, em data anterior à sua própria assinatura. 6. Agravo regimental improvido. (STF – Ag.Reg.6.650-9/PR)

O mérito da reclamação ainda não foi julgado21.

Na sequência, ainda no ano de 2008, outra Reclamação chegou ao Supremo, a de número 6.702-5/PR.

Essa reclamação também foi ajuizada contra ato decisório do Juiz de Direito da 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, atacando decisão deste, em sede de ação popular, que manteve, no início daquela ação, a posse de Maurício Requião de Mello e Silva, também irmão do então Governador Roberto Requião de Mello e Silva, no cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná, para o qual foi nomeado por decreto firmado pelo próprio Governador.

O pedido liminar foi indeferido pelo Ministro Relator Ricardo Lewandowski, que, na fundamentação fez menção genérica ao julgamento do RE 579.951/RN, referindo que naquele foi formada a distinção entre cargo estritamente administrativo e cargo político, não chegando a afirmar expressamente que a súmula pura e simplesmente não se aplicaria aos agentes políticos.

Dessa decisão que indeferiu a liminar, também foi interposto no Supremo Agravo Regimental, que foi provido sob o argumento, também do relator Ricardo Lewandowski, de que os conselheiros do Tribunal de Contas não são agentes políticos e que, naquele caso concreto, “o processo de nomeação de Maurício Requião de Mello e Silva, ao menos em primeira análise dos autos, sugere a ocorrência de vícios que maculam a sua escolha por parte da Assembleia Legislativa do Estado” (Rcl 6.702-MC-AgR/PR – inteiro teor – pg. 8).

Na sequência o Juízo curitibano reclamado prolatou decisão de mérito e julgou parcialmente procedente a ação popular para declarar a nulidade do Decreto Estadual 3.044/2008 “pelo qual o segundo requerido foi nomeado antes mesmo da existência de vaga para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado”, fato esse que culminou na perda superveniente de objeto da reclamação.

Adiante, já no ano de 2011, foi proposta no STF a Reclamação 12.478/RJ, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra nomeação de Lenine Rodrigues de Lima, para o cargo de Secretário de Educação daquela municipalidade, já que este é irmão do então Prefeito do Município de Queimados/RJ, Max Rodrigues Lemos. O reclamante sustentou que “a redação atual da Súmula Vinculante 13 não reconhece exceções relacionadas à nomeação de parentes para cargos de natureza política”. O relator, Ministro Joaquim Barbosa, deferiu a cautelar para determinar o afastamento do irmão do Prefeito do cargo de Secretário da Educação daquele Município, asseverando que:

Assim, em linha com o afirmado pelo reclamante, tenho que os acórdãos proferidos por este Supremo Tribunal Federal no RE 579.951 e na medida cautelar na Rcl 6.650 não podem ser considerados representativos da jurisprudência desta Corte e tampouco podem ser tomados como reconhecimento definitivo da exceção à Súmula Vinculante 13 pretendida pelo município reclamado. Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não prevê a exceção mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da situação concreta descrita nos autos, (…) (o grifo não consta no original)

Essas são as principais decisões que circundam a súmula vinculante e sua aplicação aos agentes políticos.

4 DO NEPOTISMO E DA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Traçado o caminho até a Súmula Vinculante nº 13, necessárias algumas colocações sobre nepotismo e suas consequências no âmbito constitucional.

O nepotismo foi muito bem definido pelo Ministro Ricardo Lewandowski no seu voto de relatoria do RE 579.951, antes mencionado. Segundo ele:

do ponto de vista etimológico, a palavra nepostismo tem origem no latim, derivando da conjugação do termo nepote, significando sobrinho ou protegido, com o sufixo “ismo”, que remete à ideia de ato, prática ou resultado. A utilização desse termo, historicamente, advém da autoridade exercida pelos sobrinhos e outros aparentado dos Papas na administração eclesiástica, nos séculos XV e XVI de nossa era, ganhando, atualmente, o significado pejorativo do favorecimento de parentes por parte de alguém que exerce o poder na esfera pública ou privada.

Essa conceituação, sucinta, reflete com precisão o que é o nepotismo.

Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, em seu dicionário, confirma o significado desse vocábulo: S. m. [Substantivo masculino] 1. Autoridade que os sobrinhos e outros parentes do Papa exerciam na administração eclesiástica. 2. Favoritismo, patronato”22

Então, em poucas palavras, nepotismo no setor público é o favorecimento, por meio de contratação sem concurso público, de parentes por parte de alguém que exerce o poder.

A administração pública é exercida por pessoas físicas que, a frente de entes governamentais em diferentes esferas estatais, tomam as decisões sobre qual rumo os negócios públicos tomarão, qual caminho será dado ao dinheiro público administrado e quais setores da comunidade receberão mais ou menos recursos.

Como essas pessoas físicas não manejam recursos próprios, mas valores alheios/públicos, a Constituição Federal traçou rumos a serem perseguidos pelos administradores.

Os princípios basilares a serem seguidos pelo administrador público são os da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) (Constituição Federal) (o grifo não consta no original)

Esse suporte principiológico não é exaustivo, mas representa o principal pilar para uma administração honesta e de qualidade.

O intuito do constituinte com essas determinações foi apenas positivar orientações que já devem (ou deveriam) estar no intelecto do administrador público, de modo que as decisões, em atos administrativos vinculados, e principalmente nos discricionários, têm sempre que visar ao melhor para a administração.

Em palavras de Affonso Ghizzo Neto:

(…), a atuação do administrador público em todas as searas publicas, deve se pautar pelo fiel cumprimento dos princípios constitucionais, concedendo especial atenção a eficiência, transparência e moralidade, absolutamente necessárias para adequação do Estado Contemporâneo a complexidade social. 23

Nesse contexto, a prática do nepotismo fere principalmente24 três desses princípios, quais sejam, o princípio da impessoalidade, de legalidade e o da moralidade.

A doutrina de Odete Medauar esclarece o que é o princípio da impessoalidade:

Com o principio da impessoalidade a Constituição visa obstaculizar atuações geradas por antipatias, simpatias, objetivos de vingança, represálias, nepotismo, favorecimentos diversos, muito comuns em licitações, concursos públicos, exercício do Poder de polícia. Busca, desse modo, que predomine o sentido de função, isto é, a idéia de que o poderes atribuídos finalizam-se ao interesse de toda coletividade ou difusos, a impessoalidade significa a exigência de ponderação equilibrada de todos os interesses envolvidos, para que não se editem decisões movidas por preconceitos ou radicalismos de qualquer tipo. 25

Em uma outra linha, o doutrinador constitucionalista José Afonso da Silva coloca que:

O princípio ou regra da impessoalidade da Administração Pública significa que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário. Este é um mero agente da Administração Pública, de sorte que não é ele o autor institucional do ato. Ele é apenas o órgão que formalmente manifesta a vontade estatal. Por conseguinte, o administrado não se confronta com o funcionário x ou y que expediu o ato, mas com a entidade cuja vontade foi manifestada por ele. É que a ‘primeira regra do estilo administrativo é a objetividade’, que está em estreita relação com a impessoalidade. Logo, as realizações administrativo-governamentais não são do funcionário ou autoridade, mas da entidade pública em nome de quem as produzira. (…) 26

Assim, em suma, os atos praticados pelos administradores têm que estar vinculados aos interesses da Pessoa Jurídica de Direito Público a qual estão vinculados e não aos objetivos pessoais do administrador.

Já o princípio da moralidade está intimamente ligado ao da legalidade.

Hely Lopes Meirelles traça um clássico conceito sobre a legalidade administrativa:

A legalidade, como princípio da administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. (…) Na administração pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa ‘pode fazer assim’; para o administrador público significa ‘deve fazer assim’. 27

Esse autor bem sintetizou em sua obra o que se deve entender pelo princípio da moralidade administrativa. No seu entender o agente administrativo:

[…] não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também sobre o honesto e o desonesto. Por considerações de Direito e de Moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente a lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, […] 28

Nesse aspecto, os atos administrativos devem seguir os ditames legais e morais.

Da conciliação desse três princípios é possível afirmar que as decisões e o rumo dado aos negócios da administração nunca devem visar a beneficiar de qualquer forma o patrimônio ou a pessoa do administrador, ou de qualquer outra pessoa física ou jurídica ligada a este.

O beneficiamento pessoal indireto proporcionado pelo nepotismo atenta no mínimo contra três dos princípios da administração pública.

Essas colocações objetivas a respeito dos princípios feridos pelos atos que caracterizam nepotismo são suficientes para o entendimento do tema. Em suma, o ato do administrador público, titular de cargo político eletivo, que nomeia parentes para ocupar cargos de provimento sem concurso público, nitidamente viola esse tripé de princípios.

5 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 E OS AGENTES POLÍTICOS NA VISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Supremo criou jurisprudência que polemizou a Súmula Vinculante nº 13 antes mesmo de criá-la.

Como visto, no julgamento do RE 579.951/RN o Supremo Tribunal Federal trouxe à baila a distinção entre cargos singelamente administrativas e cargos políticos, e, firmado nessa classificação, decidiu que, naquele caso, não haveria nepotismo na nomeação ao cargo de secretário, e haveria em relação ao cargo de motorista.

Na sequência, após a vigência da Súmula, o Supremo analisou as Reclamações 6.650-9/PR e 6.702-5/PR, nas quais decidiu que a súmula não se aplicaria aos agentes políticos.

Tais decisões, levaram os Tribunais de nosso país a passarem a decidir que simplesmente que a Súmula Vinculante não se aplica aos agentes políticos.

Como exemplo, tem-se essa recente decisão do Tribunal de Justiça Catarinense:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL – NEPOTISMO NO ÂMBITO DO MUNICÍPIO DE SANGÃO – EXISTÊNCIA DE OBSCURIDADE NO CONTEÚDO DO JULGADO – EIVA SANADA NO TOCANTE À OBRIGAÇÃO DE FAZER NEGATIVA PLEITEADA – ADEQUAÇÃO DA PROIBIÇÃO DE CONTRATAÇÕES FUTURAS AO INTEIRO TEOR DA SÚMULA VINCULANTE N. 13 DO STF – EXCEPCIONADA A SUBSUNÇÃO AOS CARGOS DE AGENTES POLÍTICOS E CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS COM REALIZAÇÃO PRÉVIA DE TESTE SELETIVO – RESSALVA QUE SE COADUNA COM A ESSÊNCIA DO ACÓRDÃO E DA ORIENTAÇÃO PRETORIANA ASSENTE – RECURSO PROVIDO NESTES TERMOS. À luz de precedentes da Suprema Corte e deste Sodalício, a nomeação de parentes até o terceiro grau, como, no caso, de companheira, para o cargo de Secretária Municipal, por ser de natureza axialmente política, não ofende a Súmula Vinculante n. 13,razão pela qual não se há de conjecturar de nepotismo". (Apelação Cível n. 2009.073524-1, de Campos Novos, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 22.08.2011). "Os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa (CR, art. 37, caput), que servem de fundamento à vedação do ‘nepotismo’, não impedem a contratação por prazo temporário de candidato aprovado em teste seletivo". (Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2008.059691-4, de São José, rel. Des. Newton Trisotto, j. 17.02.2009). Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos de Declaração em Apelação Cível n. 2008.072798-0/0001.00, da comarca de Jaguaruna (Vara Única), em que é embargante Representante do Ministério Público, e embargado Município de Sangão: A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar provimento aos embargos declaratórios, apenas para extirpar a obscuridade apontada no julgado, adequando a obrigação de fazer negativa pretendida pelo Parquet ao teor da Súmula Vinculante n. 13 do STF. Custas na forma da lei. O julgamento, realizado no dia 15 de outubro de 2013, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Nelson Schaefer Martins, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador João Henrique Blasi.(Embargos de Declaração em Apelação Cível n. 2008.072798-0/0001.00, de Jaguaruna. Rel.: Des. Cid Goulart. J. 15.10.2013 – o grifo não consta no original)

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tem decido da mesma maneira:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. LIMINAR. NOMEAÇÃO DA ESPOSA DO PREFEITO PARA O CARGO DE SECRETÁRIA MUNICIPAL. AGENTEPOLÍTICO. INSUBMISSÃO A SÚMULA VINCULANTE 13 DO STF. Não se submete às hipóteses da Súmula Vinculante 13, a nomeação de agente político, assim entendido o cargo de Secretário de Estado, segundo compreensão conferida pelo próprio Supremo Tribunal Federal. Entendimento seguido pelo STJ e por este Tribunal. Inexistência de ilegalidade na nomeação da esposa do Prefeito para o desempenho do cargo de Secretária da Mulher, tendo em vista se tratar de cargo político. Agravo provido. (TJPR – Agravo de Instrumento Nº 70056422900, Rel.: Marco Aurélio Heinz. J. 30/10/2013)

O Tribunal de Justiça do Paraná, também tem seguido o mesmo caminho:

APELAÇÃO CÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADMINISTRATIVA. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA AFASTADA. ESPOSA DIALETICIDADE AFASTADA. NOMEAÇÃO DE ESPOSA DE PREFEITO MUNICIPAL PARA A OCUPAÇÃO DE CARGO DE RIA SECRETÁRI SECRETÁRIA. EPOTISMO. NEPOTISMO. INOCORRÊNCIA. INOCORRÊNCIA. CARGO DE POLÍTICA. NATUREZA POLÍTICA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 13 DO ADMINISTRATIVA. STF E DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRECENTES REFORMADA. RECURSO JURISPRUDENCIAIS. DECISÃO REFORMADA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO. (TJPR – APELAÇÃO CÍVEL Nº 878.646, Rel: DES.ª MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA. J. 09/04/2013)

Assim, tomando-se como exemplo apenas três decisões, uma de cada Estado da região sul do País, é possível o entendimento do rumo tomado pela jurisprudência em decorrência das decisões pautadas que estão diretamente vinculadas à Súmula Vinculante nº 13.

Como dito, é de se observar que todas essas decisões fazem menção que a Súmula Vinculante não se aplica aos agentes políticos, sob o argumento de que assim o STF, interpretando sua própria súmula, teria já se posicionado.

Porém, ao contrário do que foi disseminado, esse “entendimento” do STF sobre sua Súmula não é simplesmente de que esta não se aplicaria aos agentes políticos.

Não há consenso entre os ministros sobre a aplicação ou não desta aos agentes políticos.

Há manifestação do Ministro Marco Aurélio, em um primeiro momento, no sentido de que, simplesmente, não existiria nepotismo na nomeação de agentes políticos não eletivos:

Desprovejo-o quanto ao secretário de saúde. Entendo que não podemos, a partir do disposto na cabeça do art. 37 da Constituição Federal, glosar a escolha. (…) Não adentro o que seria a promiscuidade Executivo/Legislativo. Fico apenas na tese segundo a qual não cabe a glosa, o provimento quanto ao agente político. (RE 579.951/RN, inteiro teor, pg. 10)

Esse mesmo Ministro, em outra oportunidade, após a edição da Súmula, manifestou-se no sentido de que não há exceção à súmula:

Indago: o Verbete vinculante nº 13 prevê – não cabe interpretar verbete, muito menos a contrario senso e vou esquecer aqui o precedente, a ocupação de cargo público anterior – a possibilidade de nomeação de parente consangüíneo, no segundo grau, para secretaria de Estado? A resposta é negativa. Não se tem, no teor do verbete, qualquer referência a agente político. Aliás versa proibição e não autorização. (Rcl 6.650-MC-AgR/PR, inteiro teor, pg. 296)

Logo adiante, ainda no mesmo voto, Marco Aurélio afirma que a decisão de primeiro grau que determinou o afastamento do irmão do então governador do Paraná não pode ser considerada como violadora da Súmula Vinculante, pois o RE 579.951/RN não pode ser tomado como precedente que permite a nomeação de agente político, pois julgou aquele caso concreto, não tendo efeito vinculante. Nesse sentido, após transcrever a Súmula Vinculante nº 13, o Ministro teceu as seguintes considerações:

Posso entender que o Juízo da ação popular, ao deferir – penso que foi uma ação popular – a liminar que implicou o afastamento, inobservou o teor desse verbete [da Súmula Vinculante]? Não posso, porque cogitou de algo totalmente diverso e, quem sabe, tenha até mesmo considerado o pano de fundo ao que me referi e que não estou aqui a analisar. Não posso julgar simplemente, com a queima de etapas, o ato do juízo. O que me cabe perquirir é se houve desrespeito. Dir-se-á que essa matéria foi versada no julgamento do Recurso Extraordinário nº 579.951, com acórdão pendente de publicação. Mas caberia reclamação, considerando esse precedente? Não caberia, porque o precedente foi formalizado em processo subjetivo, com muros subjetivos próprios, e um terceiro não poderia evocar desrespeito à decisão, nesse processo, para pretender, com isso, fulminar ato de órgão investido no ofício judicante. De duas, uma: ou admitimos – e não sei qual será a consequência – uma flexibilização sob o ângulo da adequação da reclamação ou não admitimos e concluímos, cotejando o Verbete nº 13 com a decisão que diz desrespeitosa desse mesmo verbete, que não houve menosprezo. Presidente, porque não posso empolgar o que assentado no Recurso Extraordinário nº 579.951 visando a ter base para a reclamação, já que se trata de processo subjetivo e porque o Verbete nº 13 não versa – e teria que versar expressamente – a possibilidade da nomeação verificada, peço vênia à relatora e àqueles que a acompanharam para provar o agravo interposto. (Rcl 6.650-MC-AgR/PR, inteiro teor, pg. 296-297) (o grifo não consta no original)

No final, como se percebe do grifo, o Ministro novamente reforça que não há previsão expressa no sentido de que a nomeação de agente político estaria autorizada pelo verbete da súmula em evidência, e por isso, entende que a nomeação do agente político em questão fere a súmula, de modo que, em seu voto vencido, deu provimento ao agravo no sentido de determinar o afastamento do agente político de livre nomeação, irmão do então Governador.

Constam ainda manifestações do Ministro Ricardo Lewandowski no sentido de que o RE 579.951/RN estabeleceu que a nomeação para um cargo político pode caracterizar nepotismo, a depender da análise de cada caso concreto:

“Essa questão [aplicabilidade da súmula aos agentes políticos] há que ser apreciada em cada caso concreto, (…). Quer dizer, o Ministério Público atuará em cada caso concreto e verificará se houve, ou não, ofensa aos princípios do art. 37” (Ricardo Lewandowski, inteiro teor do RE 579.951/RN, pg. 1911) (o grifo não consta no original).

No mesmo sentido, após a vigência da súmula:

Eu me permitiria fazer uma pequena observação. Por ocasião do julgamento do leading case que levou à edição da Súmula 13 estabeleceu-se que o fato de a nomeação ser para um cargo político nem sempre, pelo menos a meu ver, descaracteriza o nepotismo. É preciso examinar caso a caso para verificar se houve fraude à lei ou nepotismo cruzado, que poderia ensejar a anulação do ato. (Rcl 6.650-MC-AgR/PR, inteiro teor, pg. 292) (o grifo não consta no original)

A então ministra Ellen Gracie manifestou-se, no ano de 2008, no sentido de que o julgamento RE 579.951/RN teria sedimentado entendimento da Suprema Corte que “a nomeação de parentes para cargos políticos não configuraria afronta aos princípios constitucionais que regem a administração pública, tendo em vista a natureza eminentemente política” (Rcl 6.650-MC-AgR/PR, inteiro teor, pg. 286).

E há posicionamento do Ministro Joaquim Barbosa29 dando conta de que: “Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não prevê a exceção mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da situação concreta descrita nos autos, (…)”.

Isso é o que se tem dos Ministros mais antigos naquela corte.

Atualmente, há uma nova composição do Supremo, na qual muitos ministros ainda não se manifestaram sobre a matéria.

Assim, ao contrário do que se disseminou na jurisprudência, não existe posição do STF de que a Súmula Vinculante simplesmente não se aplica aos agentes políticos.

6 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 – UMA ANÁLISE CRÍTICA

De plano, chama a atenção a insegurança jurídica oriunda da edição da Súmula Vinculante nº 13.

Em consequência, é gritante a falta de técnica por parte do STF na edição desse enunciado jurisprudencial tão importante.

No julgamento do RE 579.951/RN, o Supremo discutiu demoradamente a existência de nepotismo na nomeação de parentes para cargos políticos não eletivos e, por incrível que pareça, na edição da Súmula, que iniciou seu trâmite no mesmo dia do julgamento deste Recurso, e foi aprovada no dia seguinte, a Corte não fez menção expressa sobre a aplicação, ou não, da Súmula Vinculante nº 13 aos agentes políticos.

Não constou da Súmula o ponto principal, já que a matéria havia sido trazid