Publicado em Jusbrasil por Mariana Alves.
Dentre os fundamentos da República Federativa do Brasil, está o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, um valor supremo, que segundo Alexandre de Moraes, concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, e por isso é intrínseco às personalidades humanas e se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida. Essa ideia inerente à pessoa constitui um mínimo invulnerável que deve ser assegurado por todo estatuto jurídico, sendo que a ordem econômica deve assegurar a todos uma existência digna e a ordem social deve ser responsável pela justiça social, garantindo educação, desenvolvimento e exercício da cidadania.
O Princípio da Dignidade Humana é uma norma autoaplicável e de eficácia plena que ganhou elevada importância no Brasil, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, pois serviu de pilar para a construção dos direitos fundamentais. A atual constituição reconheceu a prerrogativa de que todo ser humano deve ser respeitado como pessoa e de que não pode ter sua vida, corpo e saúde prejudicados. Adotar a dignidade humana como fundamento do Estado Democrático de Direito é reconhecer o ser humano como o centro e o fim do direito, esse é portanto o valor supremo absoluto da Constituição Federal.
Se considerarmos a perspectiva jusnaturalista, cujo princípio é o de que o direito natural é o que nasce com o homem, então a dignidade humana faz parte dele. Ele se apresenta em nosso ordenamento jurídico atual como uma proteção ao individuo, para que esse possa dispor de seus direitos e garantias fundamentais. Sob o prisma da dignidade, todos os humanos nascem iguais, o que os diferencia posteriormente são as condições socioculturais e econômicas.
De acordo com Elis Helena Pena:
“Os direitos fundamentais são, nessa sua dimensão natural, direitos absolutos, imutáveis e intemporais, inerentes à qualidade de homem de seus titulares, e constituem um núcleo restrito que se impõe a qualquer ordem jurídica.”
São eles também imprescritíveis, pois não são perdidos na falta de uso, inalienáveis, irrenunciáveis, e indivisíveis.
Esses direitos mencionados acima se dividem em três gerações ou dimensões, que acompanham o surgimento dos mesmos:
Direitos de primeira geração, também conhecidos como Direitos e garantias individuais. Foram os primeira a serem conquistados pela humanidade através de lutas e revoluções em busca da liberdade.
Direitos de segunda geração, os sociais, econômicos e culturais. Conquistados após a Revolução Industrial, eles englobam a saúde, a educação, a moraria, segurança pública e a alimentação, que devem ser garantidos pelo Estado, visando sempre diminuir a desigualdade social
Direitos de terceira geração, também conhecidos como direitos difusos, pois transcendem o indivíduo (supraindividuais). A revolução dos meios de transporte e comunicação, conectaram a humanidade através de um compartilhamento de valores e assim conquistaram direitos como ao meio ambiente, à paz e ao desenvolvimento.
Observa-se portanto, que o direito à vida, à liberdade, a participação na vida social, a igualdade são essenciais para o ser humano, e o princípio da dignidade humana é o fator delimitante para a condição de existência mínima dele.
É importante questionar que, de que adianta o Estado garantir uma vida repleta de direitos e garantias, se ela própria não é digna.
A partir do momento que se criou uma consciência de que o homem não é um objeto, endendeu-se que o ser racional precisa de uma proteção a si mesmo contra os atos cometidos pelos seus conviventes em situações de conflito, quando se perde parcial ou totalmente o discernimento.
Indissociável se torna, consequentemente, a vinculação entre o principio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, uma das bases do direito constitucional contemporâneo, mesmo nos ordenamentos cujo direito positivo ainda não reconhece expressamente a dignidade.
Segundo Fahd Awad:
“Pode-se afirmar que o poder público, as instituições sociais e particulares, bem como a ordem jurídica, que não tratam com seriedade a questão da dignidade da pessoa humana não trata com seriedade os direitos fundamentais e, acima de tudo, não levam a serio a própria humanidade.”[1]
Quando se trata de dignidade, valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, é mister ressaltar que sem ela, não poderiam os homens desfrutar das conquistas que fizeram ao longo dos séculos, as quais hoje, constituem esses mesmos direitos fundamentais, presentes na grande maioria das Constituições contemporâneas, uma vez que ela serve como uma espécie de parâmetro para determinar as condições da vida humana.
Para concluir, é necessário um exame de um caso concreto, que permita considerar cada norma de direito fundamental, nos exatos termos da ofensa. Nas palavras de Sarlet:
“Parece-nos irrefutável que, na esfera das relações sociais, nos encontramos diuturnamente diante de situações nas quais a dignidade de uma determinada pessoa (e até mesmo de grupos de indivíduos) esteja sendo objeto de violação por parte de terceiros, de tal sorte que sempre se põe o problema – teórico e prático – de saber se é possível, com o escopo de proteger a dignidade de alguém, afetar a dignidade do ofensor, que, pela sua condição humana, é igualmente digno, mas que, ao mesmo tempo naquela circunstância, age de modo indigno e viola a dignidade dos seus semelhantes, ainda que tal comportamento não resulte – como já anunciado alhures – na perda da dignidade.
Neste contexto, vale lembrar a lição do publicista germânico Brugger, que, ao discorrer justamente sobre esta temática, parte da premissa – que nos parece correta – de que a Lei Fundamental da Alemanha quando no seu artigo 1, inciso I, anunciou que a ‘dignidade do homem é intangível’, justamente tomou por referencia a experiência de que esta dignidade é, de fato, violável e que por esta razão necessita ser respeitada, e protegida, especialmente pelo poder que, apesar de muitas vezes ser o agente ofensor, ainda acaba sendo a maior e mais efetiva instancia de proteção da dignidade da pessoa humana.”[2]
Referências
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13ª Edição. São Paulo – São Paulo, 2003. Editora Atlas.
AWAD, Fahd. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Justiça do Direito, Passo Fundo, V. 20, N. 1, P. 111-120, 2006.
GONÇALVES, Ellen Prata. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e suas peculiaridades. Disponível em. Acesso em: 30 de setembro de 2013, às 22hrs e 52min.
KUMAGAI, Cibele; MARTA, Taís Nader. Princípio da dignidade da pessoa humana. Disponível em. Acesso em: 30 de setembro de 2013, às 22hrs e 55min.
LEMISZ, Ivone Ballao. O princípio da dignidade da pessoa humana. Disponível em. Acesso em: 30 de setembro de 2013, às 21hrs e 34min.
PENA, Elis Helena. Direito Natural, Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e Artigo 5º, Inciso X da Constituição Federal em conflito com o Princípio da Proporcionalidade. Disponível em. Acesso em: 1 de Outubro de 2013, às 14hrs e 56min.
[1] AWAD, Fahd. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Justiça do Direito, Passo Fundo, V. 20, N. 1, P. 119, 2006.
[2] SARLET, Ingo Wolfgang, Dignidade da pessoa humana e Direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2001, pg. 152.