O Iluminisno foi um movimento da elite de intelectuais liderado pela França, presumivelmente no início do século XVIII, “que objetivou mobilizar o poder da razão e posicionou-se contra a intolerância da Igreja e do Estado…
*Antônio Augusto Ribeiro Brandão
A escritora Gertrude Himmelfarb, então professora da City University de Nova York, em tempos idos lançou a obra “Os caminhos para a modernidade”, que pretendia ser “uma tomada de posição em favor do iluminismo mais reformista do que revolucionário.”
Com o professor José Dulce Melo Frota, no Ginásio Caxiense, aprendi sobre o “despotismo esclarecido ou ilustrado, ou ainda absolutismo ilustrado”, uma forma de governo vigente no leste da Europa na segunda metade do século XVIII, principalmente na Prússia, Áustria e Rússia, onde pontificavam a alta burguesia e o baixo poder político; houve ainda experiências despóticas em outros países a exemplo de Portugal e Espanha.
Pensadores que nessa época frequentavam os palácios de reis e rainhas “eram animados pelos ideais do progresso, reforma e filantropia do iluminismo.” Os governantes influenciados por essas ideias, ao mesmo tempo em que enalteciam o Estado e o poder absoluto do soberano, cuidavam geralmente de economias muito atrasadas e essencialmente agrícolas.
A professora Gertrude pretendia conferir “aos filósofos britânicos a primazia que sempre coube aos franceses no pensamento iluminista”, mas a mim, sempre, causou espécie o fato de os ideólogos e líderes da Revolução Francesa de 1789, acabando com os privilégios do clero e da nobreza, não terem conseguido consolidá-la; em vez disso foram perseguidos e ‘punidos’ pelo Terror decorrente.
O Iluminisno foi um movimento da elite de intelectuais liderado pela França, presumivelmente no início do século XVIII, “que objetivou mobilizar o poder da razão e posicionou-se contra a intolerância da Igreja e do Estado.”
Expressões desse movimento foram o filósofo John Locke (1632-1704) e o matemático Isaac Newton (1643-1727). O centro dessas ideias foi a França, ideias essas que culminaram com a Encyclopédie (1751-1772) editada por Denis Diderot (1713-1784), com contribuições de François Marie Arouet, o Voltaire (1694-1778), e Charles de Montesquieu (1689-1755).
Houve diversas fases desse movimento iluminista: na França, país de tradição católica, mas com presença de protestantes, onde Voltaire foi considerado “um dos maiores filósofos iluministas da história”, houve resistências políticas crescentes; conflitos “entre uma sociedade feudal e católica e as novas forças de pendor protestante e mercantil” acabaram por levar à Revolução.
No Reino Unido, entretanto, onde a influência da Igreja havia sido definitivamente afastada do poder político, em 1688, pela Revolução Gloriosa de 1688-1689, daí por diante “nenhum católico voltaria a subir ao trono.”
Talvez esse seja um dos motivos pelos quais a escritora Gertrude queira atribuir aos ingleses, e não aos franceses, a primazia no pensamento iluminista, “mais reformista do que revolucionário” conforme havia pensado Locke, um dos principais teóricos do Contrato Social; é “uma classe abrangente de teorias que tentam explicar os caminhos que levam as pessoas a formar Estados e/ou manter a ordem social”, essa obra prima de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778).
A Revolução Francesa de 1789, à qual se seguiu um longo período de convulsões, foi certamente influenciada pelos ideais iluministas e teve um desfecho inexorável principalmente em face da situação político-econômica vigente, “em causa o Antigo Regime e os privilégios do Clero e da Nobreza.”
Voltaire vislumbrou a Revolução e disse que ele não teria “o prazer de testemunhar”; o povo, considerado o Terceiro Estado e sempre relegado, organizou-se e acabou radicalizando suas posições.
A Revolução, então, enfrentou problemas de consolidação em nome do seu lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, porque pode ter se excedido na aplicação dos princípios mais ligados à razão desprezando questões de ordem moral, estas ligadas a “sentimentos inatos como a compaixão e a empatia”, como já havia dito Adam Smith (1723-1790), em sua obra “Teoria dos Sentimentos Morais”, em 1759. Teriam sido os franceses “mais radicais e sectários”; os britânicos, mais equilibrados, mais reformistas.
Franceses ou ingleses, mesmo sendo aqueles mais racionais e estes mais pragmáticos, não se pode negar a sua participação reconhecida no processo histórico do iluminismo, embora outros pensadores tenham defendido de que “a história é um processo social independente das ações individuais”, segundo Giambattista Vico (1668-1744) ou “uma sucessão de processos dialéticos que culminariam na destruição do próprio sistema”, segundo Karl Marx (1818-1883).
Questões de razão e moral.
*Economista. Membro Honorário da ALL e da ACL. Filiado à IWA e ao Movimento ELOS Literários.