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Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública

Responsabilidade criminal e civil de quem contribui para propagação de epidemias, por Paulo Tamer

“O delito em questão, se efetiva ou consuma, com a violação ou desobediência ao ato administrativo, o dolo é genérico, consistente na vontade livre e consciente de infringir a determinação administrativa…”

PAULO TAMER

         É consultor de segurança, advogado e delegado aposentado

com mais de 30 anos de experiência, além de colunista da sua área de atuação.

 

Há muito que são punidos fatos atentatórios à saúde pública, tais como, venda de produtos deteriorados, misturados ou mesmo falsificados, como bebidas, entretanto os praxistas que se ocupavam do tema, reputavam como “Crimen Falsi”, desprezando assim o perigo comum que a venda poderia resultar.
O legislador francês aos idos do ano de 1810, entendeu que esta conduta seria capitulada entre os crimes contra a pessoa. A tendência dominante à época, desprezava o perigo coletivo, classificando a conduta entre os delitos patrimoniais (estelionato) ou contra a pessoa.
Somente por influência de Carrara, passaram a classificar esse tipo de delito de crimes atentatórios à saúde pública, como crimes contra a incolumidade pública, que põe em perigo um número indeterminado de pessoas.
Nosso código penal, ao definir o crime no seu artigo 268 “Infringir determinação do poder público, destinada a impedir a introdução ou propagação de doença contagiosa” – inspirou-se no código penal alemão, que em seu artigo 327 discorre: “Quem transgride cientemente as medidas de isolamento ou de vigilância, ou as proibições de ingresso ou circulação que a autoridade competente haja estabelecido para o fim de prevenir a introdução ou propagação de doença contagiosa”.
O bem jurídico tutelado pela legislação, é a incolumidade coletiva o que se refere a saúde pública. Infringindo as determinações da autoridade, o sujeito ativo põe em risco essa objetividade que recebe o reforço da lei. Trata-se de um crime de perigo abstrato, assim presumindo a lei de modo absoluto o perigo comum, contido na violação da prescrição da autoridade.
Bento de Faria escreve: “As determinações destinadas a impedir a introdução ou propagação constituem medidas de profilaxia e constam de normas gerais, estabelecidas em lei, ou resultam de previsões ou instruções especiais decretadas pelas autoridades sanitárias, com o fim de evitar epidemias”.
O delito em questão, se efetiva ou consuma, com a violação ou desobediência ao ato administrativo, o dolo é genérico, consistente na vontade livre e consciente de infringir a determinação administrativa.
Ao nos determos ao que dispõe o artigo 13 do código penal brasileiro, que muito bem define o nexo de causalidade, ou relação causal, onde o resultado só pode ser atribuído a quem lhe der causa.
Causa têm o significado daquilo que faz que algo exista ou aconteça; ação ou omissão correspondem respectivamente, ao comportamento humano positivo ou negativo
Tenta-se assim se demonstrar, que a responsabilidade subjetiva constitui regra geral em nosso ordenamento jurídico e, se baseia na teoria da culpa. Dessa forma para que o agente, também venha responder civilmente pelo seu ato, necessário se faz a comprovação da culpa genérica, que inclui o dolo e, a culpa no sentido restrito; no caso a imprudência, negligência e imperícia.
Estabelece o código civil brasileiro em seu artigo 927 que, quem causar dano a outrem, fica na obrigação de repara-lo. Por fim, a responsabilidade civil surge em face do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida.
A gramática portuguesa entende que dano seria todo o mal causado a alguém; assim sendo, podemos concluir que, qualquer desobediência civil que venha causar dano a alguém, no caso mais específico, as regras impostas através de atos do poder executivo para conter o avanço de uma epidemia, ou mesmo de uma pandemia que o mundo atravessa e, que desta desobediência venha ser constatado o aumento do número de pessoas doentes, estas podem pleitear, junto ao poder judiciário, que sejam indenizadas pecuniariamente pelos danos causados a saúde e, por consequência, a pecúnia gasta no tratamento de saúde a que foram submetidas.  
Observa-se então, que o agente pode responder criminalmente e civilmente pelo ato praticado.